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João Cesário de Lacerda
João Cesário de Lacerda

Lacerda (João Cesário de).

 

n.      24 de julho de 1841.
f.       22 de novembro de 1903.

 

Médico naval, conselheiro, governador-geral da província de Cabo Verde, diretor do hospital da Marinha, etc,.

Nasceu em Lisboa a 24 de julho de 1841, onde também faleceu a 22 de novembro de 1903. Era filho o professor régio João António de Lacerda.

Cursou a Escola Politécnica e depois dos respectivos preparatórios matriculou-se na Escola Médico Cirúrgica de Lisboa, cujo curso terminou em 1865, defendendo tese a 24 de julho, dia em que completava vinte e quatro anos de idade. A tese foi publicada nesse ano, tendo por título: Apontamentos para a descrição patológica do cancro do fígado.

Logo no primeiro ano do curso havia assentado praça como aspirante a facultativo do ultramar donde mais tarde obteve transferência para o quadro da armada. Achava-se já despachada facultativo naval de 2.ª classe quando no verão de 1865 teve de ir a bordo da corveta Sagres na esquadrilha comandada pelo visconde de Soares Franco, realizar a sua primeira viagem acompanhando o rei D. Luís e a rainha senhora D. Maria Pia em digressão para Inglaterra. Mas um temporal que se levantou na baía da Biscaia obrigou a esquadrilha a arribar e João de Lacerda não passou do porto de Vigo, donde regressou a Lisboa. Teve pouca demora, embarcando logo a bordo da barca Martinho de Melo, que a 19 de outubro do mesmo ano de 1865 partiu com destino a Macau e escala por Timor. Seguiu-se atravessar o mar da Índia, e procurar depois as ilhas da Oceânia. Java e Timor foram na quinta parte do mundo os pontos principais em que João de Lacerda concentrou toda a sua atenção de fino observador. De Timor passou a barca Martinho de Melo ao porto de Macau, e dali voltou para Lisboa, onde chegou já no ano de 1866. 

A propósito desta viagem publicou João de Lacerda na Gazeta Medica de Lisboa uns artigos sob o título de Clínica naval. Partiu depois para uma estação em Cabo Verde, onde esteve três anos, de 1867 a 1870, prestando bons serviços tanto na clínica hospitalar como na civil. Por ocasião de se desenvolver na cidade da Praia em 1868 a febre amarela foi importantíssima a sua dedicação para com os doentes, o que lhe mereceu ser agraciado com o hábito de cavaleiro da Ordem da Torre e Espada. Data dessa estação o Relatório que João de Lacerda escreveu acerca duma epidemia de febres tifóides observada na ilha Brava. Este Relatório foi mandado publicar na Gazeta Médica de Lisboa, pelo director da repartição de Saúde Naval e do Ultramar João Francisco Barreiros. Durante esta estação de Cabo Verde, João de Lacerda foi diversas vezes à Guiné em desempenho de suas funções oficiais. Em 1870 regressou a Lisboa, com bastante mágoa dos habitantes, que lhe consagravam verdadeira estima, e o próprio governador da província, reconhecendo as suas elevadas aptidões, o propôs ao governo para secretário geral da mesma província, para que foi nomeado por decreto de 9 de novembro de 1870. João de Lacerda seguiu viagem no vapor Zaire para Cabo Verde a 5 de dezembro seguinte, tomando posse do seu novo cargo a 19 do referido mês. Conservou-se perto de três anos nesta situação, sendo exonerado a seu pedido, por decreto de 19 de julho de 1873, continuando no exercício das respectivas funções até pessoalmente entregar ao seu sucessor o expediente da secretaria em 19 de outubro. 

Em 8 de agosto de 1871 fora promovido a médico de primeira classe. Pela portaria de 18 de novembro de 1873 teve de dirigir na província de Cabo Verde o serviço de saúde, e só em 20 de janeiro de 1874 é que pôde embarcar para Lisboa. Durante quase três anos aqui se conservou entregue à clínica do hospital da Marinha, ou ocupado em variadas comissões de serviço médico-naval. Em dezembro de 1876 partiu novamente para Cabo Verde, como secretário-geral, proposto pelo governador Vasco Guedes de Carvalho e Meneses, e ali permaneceu até julho de 1877, época em que regressou a Lisboa com licença, por se sentir doente. A maneira como se houve no desempenho de tão importante cargo, tanto da primeira como da segunda vez, atestam os reiterados elogios que lhe dispensaram os governadores com quem serviu, sendo um dos mais honrosos o ofício que vem publicado na Ordem da Armada n.º 3, de 14 de fevereiro de 1874, do governador Caetano Alexandre de Almeida e Albuquerque. 

Quando João de Lacerda chegou a Lisboa em 1877, achava-se vago o lugar de director da repartição de Saúde Naval e do Ultramar, pelo falecimento de João Francisco Barreiros, e o seu nome foi indicado para preencher aquela vaga; João de Lacerda teve aquela nomeação, acedendo a pedir a sua exoneração do cargo de secretário geral. Exerceu o referido lugar de director todo o tempo que durou semelhante organização de serviço, e desempenhando com proficiência notável os deveres inerentes a um cargo de tantas exigências e de tanta responsabilidade. Quando em 1878 foi extinta aquela repartição, João de Lacerda passou para chefe da secção de saúde na direcção geral da marinha. Foi promovido sucessivamente a médico naval, subchefe e chefe em 7 de junho de 1883 e a 30 de junho de 1893, ficando depois adido à direcção geral de marinha. Em 1886, por decreto de 14 de maio, foi nomeado governador-geral da província de Cabo Verde, seguindo viagem em 6 de julho, e tão boa memória deixou no desempenho do seu cargo, que em 1898 foi novamente nomeado governador da mesma província, em substituição de Serpa Pimentel, que recolheu à metrópole para cuidar da sua saúde, e para ali partiu em 23 de janeiro. João de Lacerda foi deputado numa legislatura em 1886, eleito por Cabo Verde. 

Também se dedicou à política, tomando parte efectiva na redacção do Diário Popular, desde 1881, onde afirmou os seus créditos como escritor e hábil polemista. Colaborou no Diário de Noticias, Ilustração Luso-brasileira, Aurora Literária, Murmúrio, Revolução de Setembro, Conservador e Gazeta de Portugal. Foi correspondente do Jornal do Porto e da Aurora do Lima. Escreveu no Ocidente, vol. IV um artigo sobre os Paços do Concelho da ilha de S. Vicente, a pág. 46; outro, relativamente ao Quartel militar da cidade da Praia, de Cabo Verde, a pág. 195. Escreveu também nos Dois Mundos, Ilustração portuguesa que se publicou em Paris, de 1877 a 1881, um conto, Os cabelos de Lola. Na Biblioteca do Povo e das Escolas, do editor David Corazzi, publicou: Introdução ás ciências físicas naturais; Corografia de Portugal; Economia política; Higiene; As colónias portuguesas; Código civil português compendiado; Anatomia humana; Fisiologia humana; História antiga; História da Idade Média; As ilhas adjacentes. Nos seus tempos de estudante traduziu diversas peças para os teatros de D. Maria, Rua dos Condes e Ginásio. Escreveu uma cena cómica, Um estudante em dia de sabatina, que se representou no teatro de Almada a 17 de Junho de 1860, e nesse ano se imprimiu, saindo mais tarde, em 1864, na Tribuna teatral, formando o n.º 15 desta colecção. Foi também autor da comédia dramática em 3 actos, A coroa do artista, que se representou pela primeira vez no Ginásio a 6 de Agosto de 1863; também se imprimiu em 1864, formando o n.º 12 da Tribuna teatral. O Relatório acerca da epidemia de febres tifóides, a que já nos referimos, e que foi publicado na Gazeta Médica de Lisboa, deu origem a outro impresso pelo Ministério da Marinha, e enviado à Exposição Colonial de Amsterdão em 1883, sob o titulo de Notícias sobre febres paludosas e sobre uma epidemia de febre tifóide observadas na província de Cabo Verde, de 1867 a 1870, excertos de um relatório do serviço médico a bordo da canhoneira “Rio Minho”, na estação da mesma província. Além das condecorações, que citámos, João de Lacerda possuía também as medalhas de prata de comportamento exemplar e de bons serviços.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Portugal - Dicionário Histórico, Corográfico, Heráldico, Biográfico, Bibliográfico, Numismático e Artístico,
Volume IV, págs. 13-14.

Edição em papel © 1904-1915 João Romano Torres - Editor
Edição electrónica © 2000-2015 Manuel Amaral