Portugal - Dicionário

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Torres (José de).

 

n.       17 de junho de 1827.
f.        4 de maio de 1874.

 

Funcionário público, escritor e jornalista. Nasceu em Ponta Delgada a 17 de junho de 1827, faleceu em Lisboa a 4 de maio de 1874.

Muito novo entrou na vida pública, em fins do ano de 1841 começou a servir o Estado como amanuense da extinta Contadoria de Fazenda de Ponta Delgada. Pouco tempo depois, em 20 de dezembro de 1844, passou a oficial para a Secretaria da Câmara Municipal, sendo transferido a 2 de março de 1849 para o lugar de segundo oficial do Governo Civil do mesmo distrito, onde começou desde logo a servir de secretário geral, na ausência deste, a 19 de junho do mesmo ano. Desistindo deste último emprego, veio para o continente em 1852. Quando se procedeu à organização do Ministério das Obras Públicas, em 1859, foi nomeado 1.º oficial do novo ministério e director da Repartição de Estatística, então criada, lugar que exerceu até falecer. 

Se entrou muito novo na vida pública, também muito novo começou a vida do jornalismo, tanto político como literário. Principiou escrevendo em 1843 artigos de literatura de juvenil tentativa, no jornal político o Açoriano Oriental. Em 1844 ajudou a fundar e foi um dos redactores do Filólogo, jornal literário da Sociedade Escolástica Micaelense, de que se publicaram doze números. Em 1818, quando António Feliciano de Castilho aportou a S. Miguel e ali iniciou o grande movimento de instrução popular, José de Torres foi seu auxiliar muito valioso. Foi o 1.º secretario da Sociedade dos Amigos das Letras e Artes, fundada por Castilho, e da qual tamanha luz civilizadora se irradiou, e escreveu um Relatório brilhante que se imprimiu em 1849, dos actos da sociedade, na qual regeu cursos de geometria e de economia. No mesmo ano publicou Viagens ao interior da ilha de S. Miguel; foi a 1.ª parte da colecção que principiou a publicar com o título de Ensaios; trabalho de grande valor, tanto pela forma literária, como pelas noticias históricas referentes ás povoações que percorreu, e nos Ensaios se encontram. Em 1851 fundou a Revista dos Açores, jornal literário muito curioso, consagrado principalmente aos interesses históricos daquele arquipélago; mesmo depois do estar em Lisboa,. continuou a redigi-la, até que terminou a publicação em 1856. Em Lisboa revelou-se como orador duma maçonaria política de que era chefe o duque de Loulé. Já então estava muito em evidencia o seu elevado mérito de homem de letras e de estudo. Apreciado por aquele estadista, entrou para a redacção de jornais do seu partido, num dos quais, O Futuro publicou, além das secções políticas, uma série de valiosos artigos subordinados ao título de Interesses Micaelenses, que foram reproduzidos pelo Correio Micaelense, de Ponta Delgada, em 1858. Foi assíduo colaborador do Panorama na nova série que se começou a publicar em 1854, com o volume XI. Nas colecções deste jornal, de então até 1857, encontram se muitos artigos seus, uns assinados e outros não. Foi também redactor permanente do Arquivo Pitoresco, onde publicou artigos valiosos. Escreveu nos seguintes jornais: O Progresso, em 1854, jornal politico, cuja direcção teve quase dois anos; Angrense, Cartista dos Açores, Correio Micaelense, Verdade, Nação, Português, Pátria, Jornal do Comércio, Revolução de Setembro, Boletim do Ministério das Obras Públicas, Federação, A Opinião, jornal que redigiu desde julho de 1858 até março de 1859, etc.; Colaborou em muitos jornais literários, corno o Agricultor Micaelense, O Portugal Artístico, O Progresso Industrial, A Ilustração Luso-brasileira, Revista Peninsular, Arquivo Universal

Em 1859, como intuito de se instruir, realizou uma viagem a Espanha Inglaterra, França, Bélgica e Alemanha, feita a expensas próprias, o que acabou de o aperfeiçoar na estatística moderna ciência que, com os seus variados ramos sobre administração publica, formava um vasto campo para ele dedicar o seu grande talento e dar-lhe ampla margem à realização das suas eruditas investigações económicas Em 5 de agosto de 1832 foi nomeado chefe de secção, sendo depois pela transferência de Carlos José Caldeira para as alfândegas, promovido efectivamente a chefe de repartição, por decreto do 31 de dezembro de 1864, lugar que já estava desempenhando interinamente desde 1860. Tratou-se de se fazer o recenseamento geral da população do Reino, José de Torres urdiu as peças oficiais tendentes a esse fim; elaborou as instruções para as autoridades, arranjou modelos, criou métodos de trabalho, ideou o sistema de apuramento; e no fim de três anos de inalterável perseverança e constante labor, a nação viu, com assombro, sair dos prelos da Imprensa Nacional, autorizado pelo governo, o maior, o mais perfeito, e o mais nítido inquérito que nunca se vira em Portugal, sobre o importantíssimo assunto do Censo, ou alistamento geral da população, feito pelo método nominal e simultâneo. Precisou se saber quais os recursos que a nação oferecia para os aquartelamentos militares; o ilustre estatístico encarregou-se oficialmente dessa inquirição, e os trabalhos que então se executaram, e ainda existem arquivados, segundo dizem, são dum valor inestimável. Muitas outras reformas que se introduziram nos serviços públicos, com geral aceitação, se deveram a este distinto funcionário. Das numerosas comissões de que se encarregou, as mais espinhosas foram as dos inquéritos ás companhias União Mercantil e dos Caminhos-de-ferro portugueses e da contabilidade geral do ministério das obras públicas, que não ficou concluída. 

Extra oficialmente era José do Torres o gerente, presidente e governador de muitas outras companhias bancárias e associações industriais. Todos estes excessos de serviços lhe foram enfraquecendo as forças e aniquilando a saúde. Todo entregue aos trabalhos da Companhia de mineração Transtagana da qual era accionista e director-gerente, e a tantos outros, chegava a passar noites inteiras e consecutivas em continuas lucubrações e na solução dos mais complicados cálculos científicos Em meados de 1873 agravaram-se-lhe espantosamente os seus padecimentos, o digno chefe da repartição de estatística por conselho dos médicos, instado pelos seus amigos e pela família, quase que compelido pelo próprio ministro, resolveu abandonar temporariamente o serviço publico e largar de todo a gerência das associações, bem corno todos os demais encargos. Mas não tardou a que a morte o arrebatasse. José de Torres, despido de vaidades, recusou por vezes medalhas e distinções com que o quiseram galardoar. Rejeitou as comendas das ordens de Nossa Senhora da Conceição ele Vila Viçosa, de S. Tiago e de S. Maurício e S. Lázaro de Itália, que lhe foram oferecidas. Tendo-lhe por ultimo o governo espanhol conferido por surpresa a comenda de Isabel a Católica, José de Torres, entre os acessos febris da doença, exaltou-se e quis recusá-la publicamente. Sendo aconselhado por amigos a que tal não fizesse, guardou o diploma, mas escreveu nele pelo seu próprio punho, não aceito. Era sócio correspondente da Academia Real das Ciências de Lisboa, que lhe havia sido conferido em 8 de maio do ano de 1862 por unanimidade de votos, e de muitos estabelecimentos científicos da Europa.

Bibliografia: Bento de Góes, pequenos quadros românticos (foi a 2.ª parte dos Ensaios), Ponta Delgada, 1851; Vantagens que convidam ao estabelecimento de uma fabrica de fiação e tecidos de algodão em Alcobaça; saiu anónimo; Lisboa, 1854; O que é a guerra do Oriente? Discurso traduzido do francês, de Victor Hugo, Lisboa, 1855; sem o nome do tradutor; Melhoramentos industriais e agrícolas de Alcobaça, Lisboa, 1858; com uma planta topográfica litografada, fez-se outra edição em 1871; Crises alimentícias. Causas, remédios; discurso pronunciado em 1 de dezembro de 1856 no Centro promotor dos Melhoramentos das classes laboriosas, Lisboa, 1857; Tudo no mundo é comédia, comédia em 3 actos, Lisboa, 1860; Já viu o cometa? comédia em 1 acto; é o n.º 5 da 2.ª série do Teatro para rir, Lisboa, 1860; Lendas peninsulares, Lisboa, 1861, 2 tornos; Relatório consulta da repartição de estatística acerca da estatística geral de Portugal; (suplemento ao boletim do ministério das obras publicas), Lisboa, 18131; Relatório da comissão de inquérito nomeada em portaria, de 14 de janeiro de 1863 á administração e gerência da companhia «União Mercantil», Lisboa, 1861. Na qualidade de secretário da direcção da Companhia de mineração Transtagana, organizada em 1863, coordenou e imprimiu os relatórios da mesma direcção. Colaborou no Almanaque rural dos Açores, em 1851, mandado publicar pela Sociedade promotora de Agricultura micaelense, Ponta Delgada, 1850; e no Almanaque democrático para 1855, Lisboa, 1854. Do que em jornais publicou, são de mais alcance os seguintes trabalhos: Padroado português no Oriente; na Pátria de 1856, nºs 39 e 50; Portugal na exposição universal de Paris; Caminho de ferro de Badajoz; Minas de Portugal; Interesses açorianos; Reforma municipal. Destas séries de artigos saiu a primeira na Revista Peninsular, tomo 1 – a segunda e terceira no Jornal do Comércio, de 1857 e as duas ultimas rio Futuro, do 1853; Instrução elementar; no Panorama de 1853; Originalidade da navegação no Oceano setentrional, e do descobrimento de suas ilhas pelos portugueses no século XV; é uma memória dividida em 4 partes, inserta no Panorama, 1851; Fastos açorianos, no mesmo jornal, 1856; Diluvio de luz; Espantosa inundação do mar; A Flora; saíram todas 3 no Panorama, 1857; Alda; Constância de jesuíta; ambas na Ilustração luso-brasileira vol. I; Reinado de D. Afonso VI; é uma epanaforida histórica; em que estão dia a dia, e hora a hora registados todos as actos, principalmente domésticos daquele malfadado monarca até à época da sua anulação política, sobretudo no período em que foi casado, e mais se conspirou, tanto da sua parte como da do seu irmão D. Pedro; Açores, Olho por olho, dente por dente; Rei ou impostor? Fernão de Magalhães; Vasco Lopes, mestre de S. Tiaqo; as séries destes 5 artigos acham-se no Arquivo Pitoresco, volumes II e III; D. António Prior do Crato, estudo histórico acerca deste infeliz príncipe, pretendente ao trono de Portugal. Desde 1843 se consagrou ao estudo e investigações da história das ilhas dos Açores. Para isso consultou os mais importantes arquivos locais, o arquivo nacional da Torre do Tombo, e algumas bibliotecas nacionais e estrangeiras. Foi com esta campanha de quase 18 anos que alcançou formar a sua Colecção de Variedades Açorianas, a qual é composta de impressos e manuscritos, contendo muitas obras.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Portugal - Dicionário Histórico, Corográfico, Heráldico, Biográfico, Bibliográfico, Numismático e Artístico,
Volume VII, p
ágs. 179-181.

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