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O Portal da História Dicionário > António Feliciano de Castilho, 1.º visconde de Castilho 
António Feliciano de Castilho

© BNP

António Feliciano de Castilho, em 1836

 

Castilho (António Feliciano de Castilho, 1.º visconde de).

 

n.       28 de janeiro de 1800.
f.        18 de junho de 1875.

 

Fidalgo da Casa Real, por sucessão a seus maiores, cavaleiro da antiga Ordem da Torre e Espada; oficial da imperial Ordem da Rosa do Brasil, bacharel formado em cânones pela Universidade de Coimbra, comissário geral de instrução primária pelo método português, que ele criou; sócio da Academia Real das Ciências de Lisboa, membro do Real Conservatório, vogal do Conselho de Instrução Pública e do antigo Conselho Dramático; sócio da Sociedade Jurídica de Lisboa, e da Literária Portuense, do Instituto Histórico de Paris, da Academia das Ciências e Belas Letras de Ruão, da dos Ardentes de Viterbo, da Academia de História de Madrid, e da Arcádia Romana, com o nome de Memnide Eginense, escritor e poeta, etc.

Nasceu em Lisboa a 28 de janeiro de 1800, onde também faleceu a 18 de junho de 1875. Era filho do dr. José Feliciano de Castilho, médico da Real Câmara e lente de prima da Universidade (V. esse nome), e de sua mulher, D. Domicilia Máxima de Castilho.

Era uma criança enfezada, que afinal começava a tomar prometedoras proporções, quando adoeceu gravemente, manifestando sérios sintomas de tísica, receando-se muito que não pudesse salvar-se. Resistiu, porém, e já lia e escrevia quando nos seis anos o sarampo o prostrou novamente no leito, tomando um carácter gravíssimo; ainda teve a fortuna de resistir, mas com a infelicidade de ficar privado da vista, tornando-se inúteis todos os meios empregados pela medicina, especialmente por seu pai, para o livrar da terrível cegueira. Custa a acreditar que, aprendendo somente pelo que ouvia ou lhe diziam, Castilho pudesse alcançar tão grande erudição, o conhecimento superficial dumas poucas de línguas, e a ciência da língua portuguesa tanto a fundo, que não é fácil determinar aquilo em que mais primava, nem decidir-se se o poeta era maior que o prosador. Acompanhado por seu irmão Augusto Frederico de Castilho, quase da mesma idade, com ele estudou humanidades, se instruiu no conhecimento dos poetas latinos, que foram sempre os seus estudos predilectos, e com ele se matriculou na Universidade de Coimbra, na faculdade de cânones, em que ambos se formaram. Foi discípulo do padre José Fernandes, latinista de primeira ordem e poeta muito apreciável, a quem deveu os elementos necessários para adquirir o conhecimento profundo da língua latina, que sempre o distinguiu. O seu talento poético começou a desenvolver-se, sendo ainda criança; versejava com a máxima facilidade, e os seus primeiros versos tinham já o cunho melodioso e bocagiano; que foi o característico da sua poesia. Tinha dezasseis anos, quando escreveu e publicou um Epicédio na morte da augustíssima senhora D. Maria I rainha fidelíssima. Esta poesia causou a maior surpresa, por ser firmada por um poeta de tão tenra idade, e sobretudo cego. O paço agradeceu a homenagem à memória da soberana, concedendo-lhe uma pequena pensão, que teve apenas o carácter dum aplauso e dum incitamento.

Em 1818 publicou outro poemeto, intitulado: À faustíssima aclamação de s. m. o sr. D. João VI ao trono. Estas duas composições granjearam-lhe o despacho da propriedade duma escrivaninha de ofício de escrivão chanceler e promotor do Juízo da Correição da cidade de Coimbra, cujo lugar, pelo seu natural impedimento, era exercido por seu tio António Barreto de Castilho. Em 1820 publicou uma Ode à morte de Gomes Freire e seus sócios, e nesse ano também imprimiu anonimamente o elogio dramático, A Liberdade, para se representar num teatro particular. No sarau realizado na sala dos capelos da universidade em 21 e 22 de novembro de 1820, recitou várias composições, que andam insertas na Colecção publicada em Coimbra. Em 1821 imprimiu o seu poema pseudoclássico Cartas de Eco e Narciso, dedicadas à mocidade académica. Em outubro de 1826, sendo provido no priorado de S. Mamede da Castanheira do Vouga seu irmão Augusto, que abraçara o estado eclesiástico, e que era o seu companheiro inseparável, seguiu-o àquela solidão alpestre escondida nas abas da serra do Caramulo. Ali viveu durante oito anos. Os tempos eram difíceis, as perseguições políticas começaram pouco depois, seguiu-se-lhes a guerra civil; os seus ecos dolorosos chegavam por vezes aos recôncavos daquele retiro; seguia-os o susto, o sobressalto, a inquietação do espírito; pois através de tudo lá penetraram também os rumores da revolução literária que ia lavrando na Europa, e isto bastou para lhe alvoroçar a alma. Foi nessa época que traduziu as Metamorfoses e os Amores de Ovídeo, que escreveu muitos dos versos que depois se incorporaram nas Escavações poéticas, e que compôs dois poemetos: A noite do Castelo e os Ciúmes do Bardo. A publicação das Cartas de Eco e Narciso motivou ao poeta uma aventura romanesca. Uma dama reclusa no convento de Vairão, D. Maria Isabel Baena Coimbra Portugal, escreveu-lhe dando-se como uma nova Eco, e perguntando se ele procederia como Narciso. Esta intriga galante deu em resultado a série de quadras do Amor e Melancolia, que o poeta compôs, e publicou em Coimbra no ano de 1828. Esta senhora veio a ser sua esposa, realizando-se o casamento em 29 de julho de 1834. Pouco durou este idílio, porque D. Maria Isabel faleceu em 1 de fevereiro de 1837. No ano de 1840 acompanhou seu irmão Augusto à ilha da Madeira, e assistiu à sua morte em 31 de dezembro desse ano. Castilho tentou vulgarizar a história de Portugal numa publicação por fascículos, intitulada Quadros históricos. A Sociedade propagadora dos Conhecimentos Úteis, que fundara o jornal literário O Panorama, publicou em 1839 oito fascículos desta obra, em que colaborou Alexandre Herculano, escrevendo o último quadro. Nesse mesmo ano passou as segundas núpcias com D. Ana Carlota Xavier Vidal, natural da ilha da Madeira, que faleceu em 1871. Nos primeiros dias de 1841 voltou da ilha da Madeira, e em 1 de outubro publicava-se o primeiro número da Revista Universal Lisbonense, por ele fundada e dirigida, uma das folhas que mais serviços prestou à agricultura, à industria, às artes, à história, à moralidade e às letras. Deixou a direcção da Revista em 17 de junho de 1845, e nesse ano e no seguinte, de colaboração com seu irmão, o conselheiro José Feliciano de Castilho, deu principio à Livraria Clássica Portuguesa, onde escreveu as biografias e juízos críticos com referência a Bernardes e a Garcia de Resende.

Em 1846 fez uma rápida passagem pela política, militando no partido cartista, e escrevendo um panfleto intitulado: Crónica certa muito verdadeira da Maria da Fonte, escrevida por mim mesmo que sou seu tio, o mestre Manuel. da Fonte, sapateiro do Peso da Régua, dada à luz por um cidadão demitido que tem tempo para tudo. Por esse tempo começou também a luta em que empenhou uma grande parte da sua vida, para fazer adoptar o seu método de leitura, contra o qual se levantaram grandes polémicas. Depois, duma luta pertinaz pela violência dos adversários, só ficou vitorioso em parte, porque se o governo o nomeou comissário para a propagação do seu método e lhe deu um lugar no Conselho Superior de Instrução Pública, nunca o fez adoptar oficialmente, e foi esse o eterno pesar da sua vida. Em 1847, desgostoso por ver a frieza com que fora acolhida em Portugal a sua inovação, partiu para os Açores, onde se demorou até 1850. Em Ponta Delgada escreveu o Estudo Histérico-Poético de Camões, enriquecido de curiosas notas, fundou uma tipografia, onde se imprimiu o jornal o Agricultor Michalense, a convite da sociedade promotora da agricultura da ilha, sendo, Castilho o redactor principal; estabeleceu conferências que despertaram o amor de estudo; fundou a sociedade dos Amigos das Letras e Artes; escreveu a Felicidade pela agricultura, o Tratado de Mnemónica, o Tratado de metrificação, as Noções rudimentares para uso das escolas, e traduziu os Colóquios aldeãos de Timon; tentou radicar a tipografia e a gravura em madeira; compôs para aplicar a poesia à música, e torná-la por isso mais atractiva, o hino do trabalho que se tornou muito popular, o dos lavradores, e o da infância no estudo; por sua iniciativa se criaram na ilha escolas gratuitas, umas de instrução primária, outras de instrução secundária; aí se ensaiou pela primeira vez o método de leitura repentina.

No dia 22 de fevereiro de 1850 regressou a Lisboa, e empregou-se com violência na luta contra os adversários do seu método de leitura, que se publicaram duas edições em 1850 saindo a terceira em 1853, refundida e acompanhada de vinhetas, com o titulo de Método português Castilho. Esta propaganda também motivou grandes polémicas, em que por vezes Castilho se excedeu, como na Tosquia de um Camelo, carta a todos os mestres das aldeias e das cidades, em 1853; O ajuste de contas, em 1854, e Resposta aos Novíssimos impugnadores do Método português, de 1854, publicando neste mesmo ano a 4.ª edição do Método. Em 1853 foi nomeado comissário geral de instrução primária; então abriu cursos públicos em Lisboa, Leiria, Porto e Coimbra, para instruir os professores. Em 1865 foi ao Brasil com o intuito de propagar, o seu Método donde voltou nesse mesmo ano, sendo recebido amigavelmente pelo imperador D. Pedro II, a quem dedicou o seu drama Camões, e de quem foi sempre dilecto amigo, até à morte. Quando D. Pedro V criou em 1858 as três cadeiras do Curso Superior de Letras, ofereceu a Castilho a cadeira de literatura portuguesa, que ele não quis aceitar. Em 1861 publicou se a nova edição do Amor e melancolia, aumentada com a Chave do enigma, parte complementar desenvolvida, com a autobiografia do poeta até 1837. Em 1862 publicou-se a tradução dos Fastos de Ovídeo, em seis volumes, seguida de copiosíssimas notas escritas a seu convite por diferentes escritores portugueses. Em 1863 publicou-se o Outono, colecção de poesias. Em 1866 foi a Paris em companhia de seu irmão José Feliciano de Castilho, sendo ali apresentado a Alexandre Dumas, de quem era apaixonado admirador. Nesse ano publicou em Paris a Lírica de Anacreonte; em 1867, também em Paris, apareceu urna edição luxuosa da tradução das Geórgicas de Virgílio; em 1868 saíram os Ciúmes do Bardo, com a tradução em italiano pelo próprio autor. Castilho empreendeu a tradução do Fausto, de Goethe, primeira parte, sobre uma tradução francesa. Surgiu uma polémica violenta, chamada a Questão faustiana. Existe um grande número de cartas de Castilho publicadas em jornais e revistas a este respeito, que bem mereciam ser coligidas em volume. 

O titulo de visconde de Castilho foi-lhe concedido em duas vidas por decreto de, 25 de maio de 1870. A sua morte foi muito sentida, e no seu funeral viram-se representadas todas as classes da sociedade, os ministros, os seus colegas da Academia, os representantes das letras e do jornalismo, os homens mais ilustres no exército, da magistratura, do professorado e da armada. Do visconde de Castilho veio publicada uma minuciosa biografia escrita por A. X. Rodrigues Cordeiro no Almanaque de lembranças para 1877, outra pelo Dr. Teófilo Braga, na Enciclopédia Portuguesa Ilustrada, em publicação no Porto, vol. 2.°, pág. 639 e 640; e outra por Latino Coelho, na Revista Contemporânea tomo 1, pág. 297 a 312, 353 a 360, 453 a 459, continuando no vol. II. de pág. 177 a 183 e de pág. 321 a 336. No Dictionnaire des contemporains, de Vapereau, 3.ª edição, pág. 339, vem também a seu respeito uma notícia biográfica. Para comemorar o centenário do nascimento do notável homem de letras, colocou-se em 28 de janeiro de 1900 uma lápide na propriedade onde ele nasceu, a S. Pedro de Alcântara.

 

ver Castilho (Bibliografia de António Feliciano de Castilho, 1.° visconde de)

 

 

 

Genealogia de António Feliciano de Castilho
Geneall.pt

Textos de António Feliciano de Castilho
Projecto Vercial

Biografia de António Feliciano de Castilho
Tertúlia Bibliófila

 

 

 

 

Portugal - Dicionário Histórico, Corográfico, Heráldico, Biográfico, Bibliográfico, Numismático e Artístico,
Volume II, págs.
903-905

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