Portugal - Dicionário

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Manuscrito.

 

Documento em pergaminho ou papel; livro escrito por letra de mão. 

Os manuscritos precederam os impressos. (V. Caligrafia, Escrita, Iluminura, Letra, Livro e Tipografia.) Antes da invenção da imprensa, eram os calígrafos que faziam as vezes de tipógrafos, e numerosos indivíduos se ocupavam em escrever livros, muitos dos quais se conservam ainda hoje, não só como monumentos literários, mas como relíquias de uma arte, que tanto se elevou, tendo como fiel companheira a iluminura. Os romanos chamavam a esses copistas «scribas». 

Em Portugal houve conventos, que foram notáveis oficinas caligráficas, avultando entre eles Alcobaça, Serra de Ossa, e Santa Cruz de Coimbra. Os numerosos manuscritos do primeiro guardam-se hoje na Biblioteca Nacional de Lisboa e na Torre do Tombo, encontrando-se entre eles um manuscrito do século 11, o mais antigo que conhecemos, e atestam conjuntamente, dum modo notabilíssimo, a erudição e a perícia artística dos monges de S. Bernardo. Os de Santa Cruz conservam-se na Biblioteca Pública Municipal do Porto. São ricas, em manuscritos diversos as bibliotecas reais da Ajuda e de Mafra, a da Academia Real das Ciências, da Universidade e principalmente a Biblioteca de Évora. Algumas livrarias particulares do país conservam numerosos e importantes manuscritos (V. Biblioteca e Livraria). 

Anteriormente à descoberta da imprensa, a execução material dum livro reclamava o concurso de muitas pessoas. Assim explica Trithemo, abade de Spanheim no século 15, em o seu livro De Scriptoribus ecclesiasticis: Uma corrige o livro que outra escreveu, uma terceira ornamenta com tinta vermelha; outra encarrega-se da pontuação, outra das pinturas, como outra cola as folhas e encaderna. Ainda outras que preparam o couro e as lâminas de metal que devem ornar a encadernação. Uma outra corta as folhas de pergaminho, e outras as vão polindo, uma outra traça a estilete as linhas que devem guiar o escrevente. Enfim, outros cortavam as penas e preparavam a tinta.» Porém, havia clérigos e outros indivíduos que reuniram os diversos talentos requisitados e aptidões artísticas sob o modesto título de escrevente

No império do Oriente, no reinado de Teodósio, o Grande, existia uma classe de homens duma certa inteligência e ilustração que se empregavam em multiplicar os livros, ornando-os também com uma paciência admirável. Entre os gregos e romanos os manuscritos eram copiados por escravos, chamados literati. Embora os iconoclastas destruíssem na biblioteca de Bizâncio todos os manuscritos que tinham efígies religiosas, a arte bizantina reapareceu pelos meados do século 9, espalhando-se pela Europa, onde floresceu por largos anos na Inglaterra, Irlanda, na França, Itália e Flandres. Nesta época, derradeiros alvores da idade media, e daí por diante, nunca faltaram os calígrafos iluminadores e os miniadores nos conventos, constituindo verdadeiras escolas de caligrafia. 

Entre nós, o primeiro tratado caligráfico, em que se preceituam e exemplificam as devidas regras, é devido ao professor Manuel Barata o foi publicado em 1590. Contudo, há manuscritos portugueses dos séculos 11 a 15 de muito boa caligrafia. No reinado de D. João V apareceu um professor distintíssimo, Manuel de Andrade Figueiredo, cuja Arte se publicou em 1719, e na qual se estabeleceu ou se consolidou o carácter da letra portuguesa. No século seguinte, cumpre registar com merecido elogio o nome de J. J. Ventura da Silva, que se inspirou em Figueiredo e foi continuador da sua escola, não obstante revelar faculdades originais. O seu tratado, que se intitula Regras metódicas para se aprender a escrever, apareceu à luz, em primeira edição, no ano de 1803. Tanto a obra didáctica de Ventura como o Atlas explicativo, gravado excelentemente por dois artistas portugueses, se tornaram bastante raros, e no intuito patriótico de prestar um bom serviço à arte nacional, resolveu a, empresa editora Lopes & C.ª, do Porto, reeditar o texto e o atlas de Ventura. Este último foi primorosamente reproduzido em Paris pelo processo fotozincografia. Esta edição é precedida de uma notícia, erudita e brilhante, em que o Sr. Oliveira Ramos, esboça também a história da escola caligráfica portuguesa. A história dos antigos manuscritos justifica algumas das suas denominações actuais. Assim, volume provém de volumen, nome do rolo de papiro, que constituía os livros até ao século 2 da era cristã. Códice vem de codex, que era a junção das folhas de pergaminho, na forma por que se juntavam as tábuas enceradas e escritas.

 

 

 

 

 

 

 

 

Portugal - Dicionário Histórico, Corográfico, Heráldico, Biográfico, Bibliográfico, Numismático e Artístico,
Volume IV, págs. 807-808
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Edição em papel © 1904-1915 João Romano Torres - Editor
Edição electrónica © 2000-2015 Manuel Amaral