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Conde de Lippe

Museu Militar

Conde de Lippe

Schaumbourg Lippe (Guilherme).

 

n.     24 de janeiro de 1724.
f.     
 [ 10 de setembro de 1777 ].

 

Conde soberano de Schaumbourg, marechal general do exercito português.

 Nasceu em Londres a 24 de janeiro de 1724. 

Depois de ter estudado em Leyde na Holanda, e em Montpellier na França, entrou no serviço das guardas inglesas, sendo em breve despachado alferes, e tendo apenas dezanove anos assistiu à batalha de Dettiragen, com seu pai, então general ao serviço da Holanda. Alistando-se na marinha inglesa em 1744, deixou pouco depois essa carreira por falta de saúde, e mais tarde entrou em nova campanha ás ordens do general austríaco conde de Schulembourg, largando em seguida a vida militar. Viajou durante dois anos, e tendo vinte e um anos de idade foi chamado ao governo dos seus estados. Em 1757 uniu-se com a sua tropa ao exército hanoveriano de cuja artilharia foi nomeado grão-mestre pelo rei de Inglaterra, e nesta qualidade tomou parte em algumas batalhas.

Em 1762 o marquês de Pombal, vendo iminente a guerra entre a nossa corte, e as de Espanha e França, ao mesmo tempo que pedia socorro à Inglaterra, cuidou de contratar um general estrangeiro para comandante em chefe do nosso exercito, e por indicação do rei de Inglaterra foi escolhido para essa elevada comissão o conde Schaumbourg Lippe. A 3 de julho do referido ano se expediu o decreto nomeando-o marechal general dos exércitos, e encarregando-o do governo das armas de todas as tropas de infantaria, cavalaria, dragões e artilharia, e director geral de todas elas. Chegando a Lisboa, o conde de Lippe tratou logo de ver quais as tropas sólidas com que podia dispor, e reconheceu que apurando-as bem não tinha para compor o exercito de operações mais de sete ou oito mil ingleses e outros tantos portugueses, porque  o resto das tropas nacionais era preciso para guarnecer as praças ou formado de recrutas mais prejudiciais do que úteis nas marchas que deviam constituir as manobras principais da defensiva. Tendo apenas essa diminuta força para se opor ao exercito franco espanhol, que constava de 42.000 homens e 93 canhões, o marechal decidiu-se a limitar as suas manobras a conservar-se na defensiva, procurando apenas inquietar a marcha dos invasores, e tendo as suas tropas concentradas lança-las num momento imprevisto sobro algum ponto fraco do inimigo, imitando assim o sistema de guerra do grande Frederico. Entretanto o marquês de Sarria atravessava o rio Côa, tomava Castelo Rodrigo, e marchava sobre Almeida, e o conde de Lippe logo que teve conhecimento dessas operações concentrou as suas tropas em Abrantes, esperando ensejo para uma empresa qualquer. Em breve se apresentou esse ensejo, e o marechal, notando que os espanhóis, parecendo prepararem se para invadir o Alentejo, depois da tomada de Almeida, começaram para isso a dispor armazéns de viveres pela fronteira de Badajoz e mantinham aí em observação uns três ou quatro mil homens, concebeu o audacioso projecto de lançar no Alentejo um corpo de tropas que fosse surpreender esses armazéns a esses destacamentos inimigos e cortar ao mesmo tempo da sua base de operações o exercito que sitiava Almeida. 

Para levar a cabo este plano dividiu o marechal o seu exército em cinco fracções ou corpos, estabelecendo-se o 1.º sob o comando do conde de Loudon em Viseu, tendo por missão especial defender as províncias do norte; o 2.° ás ordens do conde de Santiago foi enviado para Castelo Branco e depois para a Guarda afim de cobrir a Beira Baixa e a Estremadura; o 3.º ficou em Abrantes para acudir onde fosse preciso; o 4.º comandado pelo coronel Burgoyne devia marchar secretamente pelo Alentejo, lançar o terror pela Extrema dura espanhola, tomar ou incendiar os depósitos de viveres e cortar quanto pudesse as comunicações de Badajoz com o exército que sitiava Almeida, o 5.º finalmente, que constituía o grosso do exército, devia, protegido pelas operações de Burgoyne, penetrar em Espanha e cortar o exército do marquês de Sarria da sua base de operações. Uma condição essencial para o êxito deste plano era que Almeida se não rendesse tão depressa, e para prevenir esse desastre ordenou o conde de Lippe ao governador que defendesse a praça até à última extremidade. Dispostas assim as coisas, no dia 21 de agosto pela manhã Burgoyne passou o Tejo em Abrantes, e dirigindo-se secretamente a Castelo de Vide, entrou em Espanha, tomou de surpresa Valência de Alcântara, aprisionou ou dispersou cinco ou seis companhias do regimento de Sevilha e quarenta dragões que vinham servindo de escolta ao marechal de campo Balanza, que também ficou prisioneiro. No mesmo dia 24 pôs-se também a caminho, atravessando o Tejo o grosso do exército, mas a pasmosa imprevidência da administração dos víveres por tal forma demorou a marcha, que ainda as nossas tropas estavam a duas jornadas de Espanha, quando veio de súbito a noticia da capitulação de Almeida. Deste modo estavam perdidas todas as combinações do conde de Lippe, e o nosso exército corria risco muito sério de ser cortado pelos espanhóis, que avançando rapidamente podiam separar as forças que estavam no Alentejo das que ocupavam a Beira Alta e a Beira Baixa. Felizmente o conde andava com prudência, e valendo-se dos regimentos que conservara em Abrantes para proteger a junção das tropas de Loudon com o grosso do exército, deu ordem ao conde de Santiago para incomodar as comunicações do inimigo enquanto pudesse, e para se internar nos desfiladeiros entre o Tejo e o Zezere logo que isso se tornasse necessário, reforçou as tropas de Burgoyne deixando –as em observação entre Portalegre e Vila Velha e ao mesmo tempo trouxe rapidamente para Abrantes os regimentos que estavam em Nisa prontos a invadir a Espanha. Apesar de tudo, se os generais espanhóis manobrassem  com rapidez, podiam nessa ocasião ter alcançado grandes resultados; mas, felizmente para nós, as operações dos invasores foram dirigidas com tal demora que o conde de Lippe pode concentrar as suas tropas e tomar as disposições convenientes para se opor ao exército franco espanhol que de Castelo Branco, onde se reunira, parecia querer passar o Tejo em Vila Velha. O marechal chamou então Burgoyne a Vila Velha e encarregou-o de defender a margem do Tejo, construindo baterias em todos os escarpados das montanhas que por ali orlam o rio e aproveitando enfim o próprio castelo da Vila que apesar de ser um mau recinto, tinha a vantagem de ser de muito difícil acesso. Colocados sérios obstáculos que impediriam o inimigo de marchar para o Alentejo, tratou o conde de Lippe de defender também os desfiladeiros das montanhas que entre o Zezere e  o Tejo vão ter a Abrantes, mas ao mesmo tempo com certo desejo de que os inimigos desistindo de atravessarem o rio seguissem o caminho desses desfiladeiros, cuja defesa foi confiada às tropas do conde de Santiago, chamadas à pressa da Beira Baixa. Depois de ter perdido muito tempo o conde de Aranda que substituíra o marquês de Sarria no comando do exército espanhol, o que obrigou o conde de Lippe a retrogradar em pouco das posições que ocupava indo então postar-se em frente de Abrantes. Os inimigos, porém, quase nada aproveitaram com aquela vantagem, porque tendo na sua frente o marechal com as tropas  em posição fortíssima, eram fatigados por combinadas excursões, e tinham de viver e marchar nesse país devastado e sem estradas, e onde todas as operações de guerra eram dificílimas. O conde de Santiago recebera ordem para fazer retirar da Beira tudo o que pudesse servir à subsistência e marchas do invasor, e o conde de Lippe para aumentar os embaraços do inimigo, mandou contramarchar o conde de Loudon e reforçando-se com mais algumas tropas deu-lhe ordem de marchar para Penamacor afim de cortar as comunicações aos invasores. Entretanto o conde de Lippe não cessava de fortificar a sua magnifica posição, de a guarnecer e fornecer com artilharia e de estabelecer comunicações com a margem sul do Tejo, afim de se ligar com o corpo de Burgoyne. Ao mesmo tempo o Outono auxiliava-o, as tempestades haviam começado, o exército espanhol exposto às intempéries da estação com falta de víveres e de comodidades, atacado incessantemente pelos destacamentos portugueses, começou a achar-se em posição muito crítica. Ao saber que o conde de Loudon aparecia no Fundão, o conde de Aranda, vendo que não podia  tomar Abrantes, recuou e foi novamente ocupar Castelo Branco com  a intenção de emendar o erro que cometera, e de passar ao Alentejo em vez de prosseguir à invasão pela Beira Baixa. O conde de Lippe pôs-se logo em movimento para estorvar o plano do adversário, mas o mau tempo dificultou a operação, e o conde de Aranda voltou para Espanha. A guerra, porém, estava a findar. A Espanha fora infeliz nas suas tentativas contra Portugal, infelicíssima no mar e nas colónias, a França também suportara graves perdas marítimas, no continente. Frederico II obtivera a neutralidade dos russos, e depois de muitas alternativas dessa guerra dos Sete Anos, conseguira ganhar sobre os austríacos nova vitória decisiva. Em Fontainebleau reuniram-se os plenipotenciários discutindo o tratado de paz, e em vista disto o conde de Aranda e o conde de Lippe concordaram entre si um armistício que foi assinado no dia 1 de Dezembro de 1762, e que terminou no dia 11 com a chegada do próprio conde de Oeiras, que vinha trazer a notícia que no dia 3 de outubro se assinara em Fontainebleau a paz entre a França, Inglaterra, Espanha e Portugal. A 7 de março seguinte foi proclamada a paz definitiva, e no dia 20 de abril o conde de Lippe partiu para Lisboa. 

Esta campanha de 1762 teve uma grande importância para Portugal, porque ela datou a reorganização do nosso exército, e porque o conde de Lippe desenvolveu nessa guerra um grande tacto militar. Terminada a luta, o marquês de Pombal ocupou-se de reorganizar o exército, e nesse empenho o ajudou poderosamente o conde de Lippe. A disciplina e a instrução das tropas mereceram a principal atenção do marechal, que publicou os conhecidos Regulamentos de infantaria, cavalaria, e os artigos de guerra que se conservaram em vigor por muitos anos, sendo depois substituídos por um novo código de justiça militar. Da defesa do país e do melhoramento das fortificações, também se não esqueceu o conde de Lippe, e a ele se deve a construção do forte junto a Elvas, chamado hoje forte da Graça, mas que por muito tempo conservou o nome de Forte de Lippe. O conde voltou então À sua pátria,  elevado por D. José à dignidade de príncipe de sangue com tratamento de alteza, e recebendo nessa ocasião valiosos presentes, que consistiram em 6 canhões de ouro pesando cada um trinta e duas libras montados em reparos de ébano chapeados de prata, e um botão e uma presilha de brilhantes.

 

 

 

 

Publicações Alemãs Sobre o Conde de Lippe Uma Orientação Bibliográfica por Pedro Brito
Revista Militar

 

 

 

 


Portugal - Dicionário Histórico, Corográfico, Heráldico, Biográfico, Bibliográfico, Numismático e Artístico,
Volume VI, pags. 764-765.

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