Portugal - Dicionário

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Fernando (D.)

 

n.      [ depois 1217 ].
f.       [ c.1243 ].

 

Infante, filho de D. Afonso II e da rainha D. Urraca, conhecido pelo nome de infante de Serpa, por ter estabelecido a sua residência em Serpa, senhorio que lhe dera seu irmão D. Sancho II, depois dele ter cedido à Coroa, a troco duma certa soma tudo quanto possuía, tanto o que herdara de seu pai e de sua irmã D. Leonor, princesa de Dinamarca, como o havido de outra origem.

Raras vezes frequentava a corte, mas apesar disso servia D. Sancho com sincera vontade, como principalmente o demonstrou na questão que resultou da sucessão de D. Paio, bispo de Lisboa. Quando faleceu este prelado, dois pretendentes disputavam a mitra: Sancho Gomes, que tinha a seu favor as simpatias da Coroa, e mestre João, deão da Sé, que era muito estimado em Roma. A escolha do cabido recaiu no deão, mas tendo Sancho Gomes também obtido alguns votos dos capitulares, o partido da corte de que o infante de Serpa se tornou então o chefe, tomou a seu cargo fazer com que o deão cedesse o campo ao seu adversário. D. Fernando entrou em Lisboa acompanhado de homens de armas apoderou-se de tudo quanto possuía mestre João, incendiou-lhe a casa, sequestrou os bens de todos os parentes, e como fosse avisado que os familiares haviam escondido na igreja diferentes alfaias, correu sobre eles, mas ao ver as portas fechadas, ordenou aos homens de armas que arrombassem o tecto, e descessem a abri-las. Os homens de armas recusaram-se a violar o templo, e o senhor de Serpa não desistindo do seu intento, chamou alguns sarracenos, dos muitos que residiam em Lisboa, e esses, menos escrupulosos, obedeceram prontamente, cometendo os maiores sacrilégios e sem atenderem a consideração alguma, derrubaram a cruz que estava no altar, espalharam pelo pavimento da igreja os santos óleos e as partículas sagradas. A noticia destas sacrílegas violências chegaram a Roma, e o papa Gregório IX ordenou logo terminantemente que o rei de Portugal desse pronta satisfação ao clero por tantos agravos, acompanhando esta ordem com as mais terríveis ameaças e com o interdito fulminado sem misericórdia. 

D. Sancho II curvou se submisso ás imposições da cúria romana, e nessa humilhação o acompanhou o infante D. Fernando, que, cheio de remorsos saiu de Portugal, e foi a Roma lançar-se aos pés do pontífice, que lhe perdoou o ultraje, condenando-o, porém, a penitencias as mais severas, que o infante religiosamente cumpriu, restituindo tudo quanto sequestrara, e também resgatasse até onde o permitissem as suas forças, e conforme a vontade dos prelados, os danos e afrontas feitas em geral à Igreja. Determinou-lhe igualmente rigorosos jejuns e humilhantes cerimonias a que teve de sujeitar-se, entre as quais se contava a de ser açoitado a porta da igreja que desacatara, impondo-lhe além disso a obrigação de guerrear durante três anos os sarracenos, e de ser em Portugal o defensor a todo o transe das imunidades eclesiásticas. Não contente com estes castigos, a cúria teve a habilidade de semear a discórdia entre os dois irmãos, autorizando o infante a recobrar a parte dos bens que tinha herdado por morte de D. Leonor de Dinamarca, servindo de pretexto que o contrato da cessão feito com D. Sancho sobre esses bens, não podia ser válido, por ser ainda menor o infante quando se realizou. Regressando à pátria tomou parte nas guerras contra os infiéis dirigidas por D. Sancho, mas quando este soberano se entregou à inacção, D. Fernando, resolvido a cumprir exactamente a penitencia que lhe fora imposta, passou a Castela, e casando com uma filha do conde Fernando Nunes de Lara, fez-se vassalo de Fernando III. Depois desta época ainda há notícia de que o infante de Serpa serviu sob os pendões do príncipe D. Afonso, mais tarde Afonso X, contra os sarracenos. Desde o ano de 1243 mais nada se sabe acerca deste irmão de D. Sancho II, o que faz acreditar que falecesse nessas guerras.

 

 

 

 

 

 

 

 

Portugal - Dicionário Histórico, Corográfico, Heráldico, Biográfico, Bibliográfico, Numismático e Artístico,
Volume III, pág. 383
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Edição em papel © 1904-1915 João Romano Torres - Editor
Edição electrónica © 2000-2012 Manuel Amaral