|  |  |  | Carvalho
            e Araújo (Alexandre
            Herculano de).   n.      
            28 de março de 1810.f.        13 de setembro de 1877.
  
             Grande
            historiador. 
            
             Nasceu
            em Lisboa a 28 de março de 1810, faleceu em Vale de Lobos a 13 de setembro de 1877.
            
            Era
            filho de Teodoro Cândido da Araújo, recebedor da antiga Junta dos
            Juros, hoje Junta do Crédito Público, e de D. Maria do Carmo de S.
            Boaventura, filha de José Rodrigues de Carvalho, pedreiro empregado
            nas obras da Casa Real. A sua educação literária começou com o
            estudo do latim e latinidade nas aulas dos padres congregados de S.
            Filipe Nery, do hospício das Necessidades, sendo seu mestre o padre
            Vicente da Cruz. Preparava-se
            para continuar os preparativos indispensáveis para a matrícula na
            Universidade de Coimbra, mas em 1827, cegando seu pai, e sofrendo
            seu avô materno um grande revés da fortuna, pela falta de
            pagamento de somas importantes de que era credor como mestre nas
            obras da Ajuda, faltaram-lhe os recursos; contudo, Alexandre
            Herculano não desanimou do seu propósito de se ilustrar, e
            conseguiu aprender particularmente as línguas francesa, inglesa e
            alemã, matriculando-se no primeiro ano da Aula do comércio em
            1830, seguindo o curso de Paleografia, a que então se chamava
            Diplomática, na Torre do Tombo, regido por Francisco Ribeiro
            Dosguimarães, no ano lectivo de 1830-1831. Desta época data a
            primeira revelação que teve da literatura alemã, que lhe fez a
            marquesa de Alorna, como ele próprio confessa na biografia que
            escreveu daquela ilustre senhora. Contava 21 anos, e já o jovem
            estudante, com os conhecimentos variados que adquirira, bem mostrava
            que a sua mocidade fora bem dedicada ao estudo. Animavam-se então
            naquela época os ânimos políticos; a guerra civil com todos os
            seus horrores absolutistas, enchia de presos as cadeias do reino só
            pelo crime de serem liberais, e nas praças públicas eram os patíbulos
            levantados consecutivamente.  Alexandre
            Herculano viu-se obrigado a interromper os estudos para seguir a
            voragem da revolução; inimigo de todas as opressões, e estrénuo
            defensor da liberdade, uniu-se aos constitucionais, e sendo
            implicado na malograda revolta de infantaria n.º 4 em 31 de agosto
            de 1831, teve de refugiar-se na casa do capelão da colónia alemã,
            passando dali a bordo da fragata francesa Melpomène, que
            estava fundeada rio Tejo, e depois, juntamente com outros emigrados,
            para o paquete inglês que se dirigia a Falmouth e Plymouth.
            Embarcou para Jersey, e dirigindo-se a Saint Malot, teve de arribar
            a Granville, seguindo daqui por terra com os seus companheiros a
            Rennes, capital da Bretanha, onde existia um depósito de emigrados
            portugueses. Nesta cidade aproveitava todas as horas de que podia
            dispor, em estudar na biblioteca os livros e manuscritos. Os
            emigrados embarcaram em Fevereiro de 1832 para Belle-Isle, na expedição
            que ia reunir-se na ilha Terceira ao imperador, que já ali estava,
            e chegaram a 19 de Março do referido ano. Alexandre Herculano fez
            parte da expedição, em que também se encontrava Garrett como praça
            de soldado de caçadores, e muitos outros homens notáveis,
            Herculano assentou praça em 26 de Março como voluntário da rainha
            D. Maria II, tendo o n.º 35 da terceira companhia. Pouca demora
            teve nos Açores, porque em 27 de Junho partia o pequeno exército
            liberal, composto de 7.500 bravos, com destino ao Porto, e em 8 de
            Julho desembarcava nas praias do Mindelo. No cerco do Porto,
            Herculano foi um dos mais valentes e dos que mais se distinguiram;
            achou-se nos mais temíveis transes, brilhando na sua nota de serviços
            datas gloriosas, como a do reconhecimento da cidade de Braga até
            Bouro em 14 de Julho de 1832, o de Valongo, a acção de Ponte
            Ferreira em 22 e 23 de Julho de 1832, etc. Em 22 de Fevereiro de
            1833 foi dispensado do serviço militar para coadjuvar o bibliotecário
            do paço episcopal; esta escolha era devida à sua paixão literária
            já conhecida, embora os seus estudos fossem até então
            incompletos.  Por
            decreto de 17 de julho de 1833 foi nomeado segundo bibliotecário da
            Biblioteca Pública do Porto, e exercia ainda esse cargo, quando
            rebentou a 10 de setembro de 1836 o movimento em Lisboa contra a
            Carta Constitucional. Herculano mandou logo no dia 17 um ofício ao
            presidente da câmara municipal dando a sua demissão, dizendo que
            partia para Lisboa, porque prestara a maior fé à Carta
            Constitucional. Partidário exaltado da Carta, a ponto de prejudicar
            os seus próprios interesses, Alexandre Herculano defendeu-a com
            toda a energia, combatendo A Revolução de Setembro, jornal
            que então se criara em oposição. No Repositório Literário, do
            Porto, publicou três ou quatro artigos veementes e de máximo
            interesse. Foi também nesta época que apareceu a Voz do
            Profeta, que pelo estilo vigoroso
            e enérgico, fulminava com o maior arrojo o movimento político de
            1836. A Voz do Profeta causou profunda impressão em todo o
            país. O rei D. Fernando  nomeou-o em 1839 seu bibliotecário,
            com o vencimento anual de 600$000 réis, pagos do seu bolso,
            dando-lhe também casa para residir; pouco depois, Herculano, sem
            exigir mais remuneração, encarregou-se de organizar as bibliotecas
            reais da Ajuda e das Necessidades. Então, engolfado entre os livros
            que eram todo o seu pensar, continuou a vida de escritor, a quem o
            futuro reservara o justificado título de poeta filosófico,
            romancista eminente, e historiador profundo e consciencioso. Em
            1837, a Sociedade Propagadora dos Conhecimentos Úteis, querendo
            fundar O Panorama, um dos jornais literários mais
            importantes que se tem publicado em Lisboa, pediu a Alexandre
            Herculano que se encarregasse da sua direcção. Foi o redactor
            principal até Julho de 1839, mas, apesar de resignar este título,
            continuou a escrever, posto que com menos frequência, assinando os
            seus artigos até 1842.  Em
            1843 efectuou-se novo contrato, e os Panoramas de 1853 e 1854
            têm muitos artigos de Alexandre Herculano, que mais tarde se
            publicaram em livros. Em 1852, conjuntamente com o marquês de Niza,
            fundou o jornal político O País, em que fez veemente oposição
            ao governo. Dois anos mais tarde organizou outro jornal, intitulado O
            Português. A Academia Real das Ciências intentou a publicação
            dos Monumentos históricos de Portugal, desde o século VIII
            até ao século XV, começando por distribuir em épocas os
            trabalhos de indagação e catalogação dos mesmos monumentos, e
            devendo a primeira parte abranger os do século VIII até ao ano de
            1280. Esta obra Importantíssima foi encetada, e compunha-se de três
            partes: Escritores, Diplomas e Cartas, Leis e Costumes. Alexandre
            Herculano havia sido nomeado sócio correspondente em 21 de fevereiro de 1844, efectivo em 13 de
            fevereiro de 1852 e de mérito
            em 14 de junho de 1850. Ninguém mais habilitado do que ele poderia
            ser chamado para um trabalho daquela ordem, para o qual eram
            precisos grandes conhecimentos de diplomática e de paleografia, e a
            maior prática de rever arquivos. O parlamento votou a dotação
            anual de 1.000$000 réis para ajudar aquela empresa nas suas
            despesas extraordinárias. Em 6 de junho do 1853 saiu de Lisboa
            Alexandre Herculano, em direcção à Beira, onde até Setembro
            visitou todos os arquivos e bibliotecas; e no ano seguinte fez igual
            digressão nos mesmos meses até à, província do Minho, colhendo
            daquelas duas jornadas uma enorme porção de documentos de todos os
            arquivos eclesiásticos e seculares, que deviam ser chamados a
            Lisboa para serem examinados detidamente. Foram excessivas as
            dificuldades com que teve de lutar, porque muitas corporações
            religiosas opuseram a maior resistência em franquearem os arquivos,
            e muitos destes também se encontravam num lastimoso estado de
            abandono. Um deplorável incidente o obrigou a afastar-se.  Sendo
            em março de 1856 nomeado guarda-mor da Torre do Tombo, Joaquim José
            da Costa Macedo, que pouco tempo antes pedira a sua exoneração de
            sócio e de secretário perpétuo da Academia, por grandes
            desinteligências que o tornavam incompatível nesta corporação
            com alguns dos seus colegas, Alexandra Herculano declarou
            terminantemente na sessão de 31 do referido mês, que em vista
            daquela nomeação, não podia voltar à Torre do Tombo, em consequência
            da incompatibilidade de privar com o novo guarda-mor; e como os seus
            trabalhos para a publicação dos Monumentos históricos exigiam
            as suas frequentes visitas ao arquivo nacional, resignava os serviços
            que poderia prestar, e assim demitia-se do cargo de vice-presidente,
            e até mesmo de sócio. A Academia em 9 de outubro do mesmo ano,
            deu-lhe novo diploma de sócio, que ele aceitou, e em Dezembro
            tornou a elegê-lo vice-presidente. Herculano, numa carta datada de
            27 deste mês, não só persiste na resolução de não ocupar a
            vice-presidência, mas declara-se «morto para as letras, enquanto
            se achar colocado pelos poderes públicos entre a humilhação e o
            silêncio, entre a desonra e a abstenção, porque a pátria tinha o
            direito de exigir tudo de seus filhos, menos o aviltamento.» Foi
            esta a razão porque deixou os Monumentos históricos e a História
            de Portugal, em que também trabalhava, e a vida activa das
            letras, entregando-se à agricultura na quinta do Calhariz,
            pertencente aos duques de Palmela, no concelho de Sesimbra, que por
            esse tempo trazia arrendada, indo desterrar-se mais tarde, em 1867,
            para Vale de Lobos, onde se conservou até falecer.  Em
            8 de outubro de 1857 fora aposentado o guarda-mor da Torre do Tombo,
            e Alexandre Herculano tinha de novo aberta a porta daquele arquivo público,
            e como sócio da Academia, que se encarregara dos Monumentos históricos,
            voltou à sua tarefa até 1873, mas por sua morte deixou
            incompleta, apesar de ficarem muito adiantadas as três partes. A História
            da Inquisição, e a maneira como descreve no 1.º volume da História
            de Portugal a batalha de Ourique, negando a aparição de Cristo
            ao fundador da Monarquia, levantaram contra ele as iras de todo o
            clero, que não se fartava de o invectivar por toda a forma, tanto
            em folhetos, como em jornais religiosos, e até nos próprios púlpitos,
            chegando a acusá-lo de deprimidor das glórias portuguesas.
            Alexandre Herculano respondeu então com toda a energia, em quatro folhetos, que publicou em 1850: Eu e o clero, carta ao
            patriarca de Lisboa; Considerações pacificas ao redactor da Nação;
            duas cartas a Magessi Tavares, intituladas: Solemnia Verba; e
            em 1851 publicou outro folheto: A ciência Arábico Académica, carta
            a Silva Túlio em resposta ao folheto dum académico.  A
            respeito do casamento civil também escreveu três estudos, por
            ocasião de ser publicado um opúsculo pelo visconde de Seabra.
            sobre este assunto. Herculano fez parte da comissão revisora do
            projecto do Código Civil, e é dele também a última redacção do
            Código. No ano de 1858 o círculo de Sintra quis elegê-lo seu representante
            em Cortes, porém ele não aceitou. Era cavaleiro da ordem da Torre
            e Espada, agraciado por decreto do primeiro de março de 1839.
            Aceitara esta mercê, porque entendia que a merecera como soldado,
            mas depois dessa data rejeitou sempre todas as honras, recusando a
            comenda da mesma ordem ao próprio soberano, el-rei D. Pedro V, que
            o procurara um dia para lha oferecer; os arminhos de par em 1861, e
            a grã-cruz da ordem reformada de S. Tiago em 1862. O motivo destas
            renúncias está exposto numa carta que publicou em 7 de dezembro de
            1862 no Jornal do Comércio.
            Apenas aceitou a eleição, por um dos círculos do Porto, para
            deputado em 1840, e a de vereador, e depois a de presidente da câmara
            de Belém em 1852. Enquanto viveu na sua casa da Ajuda, recebia
            todos os sábados a visita de muitos dos seus amigos, na maior parte
            escritores e poetas distintos, que o respeitavam como mestre, e com
            quem discutia política e literatura.  Os
            últimos anos da sua vida foram quase dedicados aos trabalhos agrícolas,
            prestando assim grandes serviços à agricultura. Poucas vezes vinha
            à Lisboa, e a última vez foi no primeiro de setembro de 1877 para
            visitar o imperador do Brasil, retirando-se para Vale de Lobos já,
            bastante doente, falecendo no dia 13, conforme dissemos. O seu cadáver
            ficou depositado na igreja da Azóia, em Santarém, no jazigo do
            general Gorjão, e no dia 15 realizaram-se exéquias solenes, a que
            concorreu muita gente de Lisboa, representantes de toda a imprensa
            periódica, de corporações, da Academia Real das Ciências,
            deputados, ministros, etc. Suas Majestades, o Rei D. Luís e Senhora
            D. Maria Pia, também se fizeram representar. Sobre o féretro foi
            colocada uma coroa em nome da imprensa periódica, onde se lia a
            seguinte dedicatória: A Alexandre Herculano, a imprensa, 15-9-77.
            As repartições e uma grande parte dos estabelecimentos de Santarém,
            conservaram-se fechados no dia do funeral, em sinal de sentimento.
            Em 27 de junho de 1888 foram solenemente trasladados os seus restos
            mortais para a igreja dos Jerónimos em Belém.  Alexandre
            Herculano casou no primeiro de Maio de 1867 com D. Mariana Hermínia
            de Meira. Era também sócio da Academia Real das Ciências de
            Turim, da Real Academia de História de Madrid, da Real Academia de
            Ciências da Baviera, membro do Instituto Histórico de França e do
            Instituto Histórico e Geográfico do Rio de Janeiro. Além do muito
            que se tem escrito sobre, o grande historiador, mencionaremos o
            artigo do Sr. Dr. Teófilo Braga, na Enciclopédia Portuguesa
            Ilustrada, publicada no Porto, vol. V, pág. 68. A Revista
            Contemporânea, 1.° vol., pág. 7; o Novo Almanaque de
            lembranças luso-brasileiro para 1879, artigo de A. X. Rodrigues
            Cordeiro, etc.
            
               Transcrito por Manuel Amaral
              
             V. também Bibliografia
            de Alexandre Herculano de Carvalho e Araújo. 
              
              
              
              
              
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