Portugal - Dicionário

A B C D E F G H I J K L M N O P Q R S T U V W X Y Z

Lazareto. 

 

Edifício próprio para as quarentenas, isolado a destinado a receber e a desinfectar as pessoas e os objectos provenientes de lugares onde reine uma doença epidémica ou contagiosa.

A instituição dos lazaretos é muito antiga, mas só relativamente tarde é que, à força de serem devastadas pela peste, as cidades do Mediterrâneo trataram de defender-se dessa terrível epidemia. Veneza estabeleceu em 1348 os provedores da saúde, a em 1403 criou um hospital numa ilha dos frades agostinhos, chamada Santa Maria da Nazaré. A palavra Lazareto vem de S. Lázaro, considerado como advogado contra os leprosos. Em Marselha as primeiras medidas datam da peste de 1476. O Lazareto de Lisboa é quase fronteiro ao Bom Sucesso, na outra margem do rio Tejo. Foi em 1490, que el-rei D João II mandou construir a uns 500 m. a Oeste de Porto Brandão uma fortaleza, a que deu o nome de Castelo de Porto Brandão. Em 1570 foi reedificada por D. Sebastião, que lhe mudou o nome para Torre de S. Sebastião de Caparica, mais conhecida geralmente nos nossos dias, enquanto existiu, pela Torre Velha. Foi nesta fortaleza que se instituiu o Lazareto, que não passava de uns antros imundos, escuros e insalubres, onde os viajantes, que eram obrigados às quarentenas, só achavam muralhas derrocadas, péssimos alojamentos e comidas também péssimas, tudo por exorbitantes preços. 

Torre de S. Sebastião de Caparica ou Torre Velha

© Exército Português

Torre de S. Sebastião de Caparica ou Torre Velha em finais do séc. 18

Assim durou até que, em 1867, o governo atendendo finalmente às repetidas queixas dos quarentenários, se resolveu a construir novo edifício para o Lazareto, depois de consultadas as pessoas competentes. Demoliu-se a velha torre, e das antigas fortificações apenas restam alguns panos de muralhas ao lume de água; por isso o actual Lazareto é obra quase toda dos nossos dias. Ali se introduziram os melhoramentos apropriados a estabelecimentos deste género, especialmente no serviço de desinfecção e de reverificação de bagagens, sendo a estufa destinada a este fim dotada dos aparelhos mais aperfeiçoados. Do Porto Brandão à antiga Torre Velha há construções para a desinfecção, vigia e hospedagem. Em baixo há uma doca que margina um cais onde estão os armazéns da alfândega A doca é um tanto desprotegida, talvez mal abrigada das nortadas fortes; os armazéns são ligados por portões de ferro à prova dos desnorteamentos candongueiros. No cais existe uma pequena barraca, onde um guarda de saúde está em permanente vigia. A seguir às arrecadações da alfândega por detrás delas, ao nível do cais, entre rochas a pique e a subida às quarentenas, estão os chamados armazéns, que são vastos recintos onde se penduram roupas e se abrem as bagagens destinadas à beneficiação, que é feita conforme a viagem. As beneficiações são pelo ar por meio de ventoinhas mecânicas, ou pelo calor nas estufas Geneste & Herscher, ou pelo ácido sulfuroso. A subida às quarentenas é por uma escada de mosaico e dali se desfruta um bonito ponto de vista, muito vasto, descobrindo-se um panorama de Lisboa, de grande efeito No alto está o hospital, enfermaria de isolamento com destino a enfermos suspeitos, e a capela de S. Sebastião, o que constitui o Lazareto velho, com barracas anexas de madeira e argamassa, para os serviçais dos barcos, em contacto com os paquetes sujos, cumprirem também a sua quarentena. Numa edificação em semicírculo estão dispostas as quarentenas, envolvidas por um carreiro estreito, denominado a ronda, para evitar alguma imprudência da parte dos quarentenários. A edificação semicircular está dividida em sectores, cada sector constitui uma quarentena, e cada quarentena é por assim dizer um hotel independente e isolado, com muita luz, muito ar, com livre entrada por muitas janelas, quartos de dormir, salas de jantar, tudo bem mobilado. A cada quarentena está anexo um pátio exterior mais ou menos ajardinado.

A cozinha é um monumento célebre. Conta-se que na Península não há nenhuma que lhe iguale. Pode alimentar por dia 1.000 pessoas. E só o fogão monstro custou 1.000 libras esterlinas. As comunicações da cozinha com os isolados são feitas por meio do habitual sistema de rodas. O palratório e a sala de visitas estão num semicírculo paralelo ao das quarentenas, e tem 21 janelas sobre um espaço para onde deitam outras tantas aberturas das quarentenas. E assim falam os quarentenários às pessoas que os vão visitar. Ao centro do palratório vê-se a capela de N. Sr.ª do Bom Sucesso para a missa dos domingos e dias santificados ser ouvida por todos os quarentenários, através das quarenta e tantas janelas que a defrontam. Tem lavandaria e quartel para o destacamento, Subindo mais encontra-se uma estação de incêndios com material para caso de sinistro, a ainda mais elevado está o cemitério com a capela caiada e cruzes engrinaldadas ao rés do solo. Serve para os que morrem de moléstias suspeitas. || Bibliografia: História dos principais lazaretos da Europa, acompanhada de diferentes memórias sobre a peste, etc. traduzida em português por José Ferreira da Silva; Lisboa, 1800.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Portugal - Dicionário Histórico, Corográfico, Heráldico, Biográfico, Bibliográfico, Numismático e Artístico,
Volume IV, pág. 89.

Edição em papel © 1904-1915 João Romano Torres - Editor
Edição electrónica © 2000-2015 Manuel Amaral