Lugar importante da província da Estremadura, pertencente à
freguesia de Belas, concelho de Sintra, distrito de
Lisboa.
É povoação muito pitoresca, e muito visitada por causa do
palácio real ali existente. Está situado em lugar baixo, cercado
de vários outeiros de pouca elevação, mas em sítio ameno, fértil
e saudável.
O palácio e quinta de Queluz foi incontestavelmente
uma das mais importantes e sumptuosas residências, que a realeza
possuía em todo o reino. Data do meado do século XVII o primitivo
edifício que pertenceu aos marqueses de Castelo Rodrigo. Nessa época,
Queluz não passava duma pobre aldeia, sem a mínima importância, e
só mais tarde, quando aquela propriedade se instituiu em residência
real, é que a povoação se engrandeceu, tendo uma época muito
florescente até ao começo do século XIX, e ainda no tempo do
governo do infante D. Miguel. Os marqueses de Castelo Rodrigo, como
traidores à pátria, perderam o direito ao palácio e quinta de
Queluz, por lhe terem sido confiscados todos os bens para a coroa de
Portugal, em Dezembro de 1640, data gloriosa da restauração do
reino do domínio castelhano. D. João IV, por alvará de 11 de
Agosto de 1654, instituiu a Casa do Infantado, em favor do filho
segundo dos nossos monarcas, e fez lhe doação nesse mesmo ano, dos
bens sequestrados ao marquês de Castelo Rodrigo e a outros
fidalgos, que também haviam seguido o partido de Espanha. O
primeiro senhor da Casa do Infantado foi o infante D. Pedro, mais
tarde rei D. Pedro II. Esta casa, que se
tornou mais grandiosa pelos rendimentos, honras e privilégios,
extinguiu-se em 1834, tendo sido D. Miguel o seu ultimo proprietário.
O palácio e quinta de Queluz começaram a ser muito frequentados
pelo seu novo possuidor, o infante D. Pedro, e essas visitas
amiudaram-se, sem serem estranhas à politica, porque se podia falar
ali desafogadamente sem receio dos espiões do conde de Castelo
Melhor, primeiro ministro e favorito d'el-rei D. Afonso VI. Seguiram
se depois as grandes intrigas palacianas, de que resultou a
destronização de D. Afonso VI, o seu desterro e prisão nos paços
de Sintra, que teve o desenlace fatal com a morte do desditoso
monarca, sucedida em 12 de Setembro de 1683. Pelo falecimento de D.
Pedro I passou a Casa do Infantado ao seu filho segundo, o infante
D. Francisco, que todos os anos passava a estação calmosa naquela
residência, que se tornara sua predilecta. No tempo deste infante,
que possuiu a propriedade perto de 35 anos, obteve o palácio e
quinta de Queluz bastantes melhoramentos. D. Francisco tinha um
filho bastardo, D. João da Bemposta, e por sua morte, formou-se
grande demanda entre os infantes D. António, irmão de D. João V e
o infante D. Pedro, filho deste monarca, que ficou vencedor, e que
mais tarde se chamou D. Pedro III, por ter casado com sua sobrinha,
a rainha D. Maria I.
D. Pedro resolveu fazer de Queluz o Versalhes
de Portugal, e por isso tratou de aumentar a propriedade, com a
aquisição de outras que lhe ficavam confinantes, encarregando do
risco e execução do novo palácio, da planta e ornatos dos jardins
e quintas, o arquitecto português Mateus Vicente de Oliveira, e o
arquitecto e escultor francês João Baptista Robillon. Em Junho de
1755 começaram os trabalhos da nova construção, e prosseguiram
com mais ou menos actividade até 25 de Maio de 1786, dia em que
faleceu D. Pedro III. Oito anos estiveram então as obras paradas, e
no fim desse tempo, em 1794, a rainha D. Maria I mandou edificar um
novo corpo do palácio, onde habitou na sua viuvez. No entretanto,
aqueles oito anos não foram tempo suficiente para se concluírem as
obras, nem os rendimentos da Casa do Infantado bastavam para as
despesas, tendo a rainha de mandar fornece avultadas somas do
tesouro público. Os jardins e parque chegaram a concluir-se, mas o
palácio ficou sempre incompleto. Durante o andamento das obras,
contudo, apenas se aprontaram acomodações indispensáveis, a família
real para aí foi residir todos os anos, nos meses de Verão.
Enquanto viveu D. Pedro III, houve festas esplêndidas no palácio
de Queluz, sendo escolhidos os dias de S. João e S. Pedro, e os dos
aniversários natalícios mais solenes das pessoas reais. As funções
constavam de sumptuosa festa religiosa celebrada de manhã na capela
por música vocal e instrumental, executada pelos mais distintos
professores nacionais e estrangeiros, que viviam em Lisboa, além dos
músicos da Patriarcal. De tarde realizavam-se corridas
de touros, ou cavalhadas em que os cavaleiros ostentavam soberbos
ginetes e custosas galas; nestas diversões tomavam parte os mais
distintos fidalgos da corte. Ao cair da noite iluminavam-se as
fachadas do palácio, os jardins e o parque. Depois ressoavam as
orquestras em harmoniosos concertos nas espaço das salas,
revestidas de espelhos, que faziam multiplicar infinitamente as
numerosas luzes dos candelabros, dos lustres e das placas, e em que
a corte se retratava em enorme auditório respondente de diamantes e
sedas multicores recamadas de ouro. Nos concertos tornavam parte a
rainha D. Maria I, então ainda princesa do Brasil, e as infantas
suas irmãs. Mais tarde servia-se a ceia, e quando a noite ia já
muito adiantada, queimava-se nos jardins um brilhante fogo de
artificio, cujas mil fantásticas invenções se alternavam com os
repuxos dos lagos, donde subiam as águas como colunas de cristal,
ou em graciosas espadanas que se cruzavam, ou noutras variadíssimas
formas. Em Queluz também se construiu um teatro sob a direcção do
arquitecto Inácio de Oliveira Bernardes, o qual se inaugurou a 17
de Dezembro de 1778, para solenizar o aniversário natalício da
rainha D. Maria I. Representavam-se naquele teatro operas líricas,
e foi um divertimento que veio tornar ainda mais brilhantes as funções
de Queluz.
Tendo-se incendiado urna grande parte do palácio velho
da Ajuda, a família real foi em 1795, fixar a sua residência no paço
de Queluz, e ali se conservou até 29 de Novembro de 1807, dia em
que fugiu para o Brasil, pela entrada dos franceses em Portugal. Em
1821, porém, tendo já falecido D. Maria I, D. João VI,
regressando do Brasil, para ali foi habitar, mas pouco tempo se
demorou em Queluz, pois, em consequência de antigas desinteligências
que então se renovaram entre o soberano e sua mulher, D. Carlota
Joaquina, D. João VI veio residir para o palácio da Bemposta, onde
faleceu em 10 de Março de 1826, ficando em Queluz D. Carlota
Joaquina só com a sua filha mais nova, a infanta D. Ana de Jesus
Maria, conservando-se ali até ao seu falecimento, sucedido em 7 de
Janeiro de 1830. Foi ainda naqueles paços que se realizou em 1827,
o casamento da referida infanta D. Ana de Jesus Maria com o marquês
de Loulé, depois agraciado com o título de duque. Queluz teve urna
triste celebridade desde a partida de D. João VI para o paço da
Bemposta, até ao ano de 1828, em que a infanta D. Isabel Maria, então
regente, entregou o governo a seu irmão D. Miguel, que se fez
aclamar rei. Essa triste celebridade foram as conspirações
permanentes que naquele palácio se fomentaram contra a liberdade da
nação, até esse ano de 1828. Durante os 5 anos que durou o
governo absolutista até Julho de 1333, D. Miguel viveu no paço de
Queluz com suas irmãs D. Isabel Maria e D. Maria da Assumpção. De
pois de ser desterrado do país, o palácio ficou abandonado até
Setembro de 1834, em que D. Pedro IV, achando-se gravemente enfermo,
o foi habitar, desejando falecer no mesmo quarto onde havia nascido,
desejo que realizou no dia 24 do referido mês e anuo. Desde essa época,
uma parte do edifício ficou sendo habitada pelas antigas açafatas
da Casa Real.
Do Archivo Pittoresco vol. VI,
transcrevemos a seguinte descrição: “Queluz tem treze salas
revestidas de espelhos e guarnecidas de obra de talha dourada, onde
se admiram lavores delicadíssimos, tendo o pavimento todo de mármore
de cores em xadrez, ou de madeiras de variadas cores e qualidades. A
sala das talhas e a das serenatas são as principais
em grandeza e riqueza. A primeira tem nos topos dois tronos, cujos dóceis
são sustentados por colunas oitavadas guarnecidas de espelhos e
douraduras; e do mesmo modo se vêem as paredes e as portas. O
pavimento é de mármore branco e azul em xadrez. No tecto está
representado em pintura um grande concerto, ou serenim, como
então lhe chamavam, em que figuram el-rei D. José e a rainha D.
Mariana Vitoria; o célebre mestre de musica David Peres, tocando
cravo ao lado do. soberano; a princesa D. Maria, mais tarde rainha;
o as infantas D. Maria Francisca Benedita, ao diante princesa do
Brasil, D. Mariana Josefa e D. Maria Doroteia, com
papéis de solfa nas mãos, em acção de cantarem; o infante D.
Pedro, depois rei, regendo o concerto, e muitas pessoas da corte.
Dão nome a esta sala preciosas talhas de porcelana do Japão, que a
decoram, colocadas no pavimento sobre peanhas de madeira com ornatos
relevados e vazados. Como indica a pintura do tecto, esta sala foi
construída expressamente para os concertos da corte; e com efeito
alguns se executaram nela, porém depois passou a servir para os
beija-mãos e audiências solenes aos ministros estrangeiros,
destinando-se para os concertos outra sala, à qual ficaram chamando
das serenatas. Esta sala é maior, e muito mais esbelta e
sumptuosa que a precedente. Paredes e portas tudo é coberto de alto
a baixo de magníficos espelhos e de esculturas douradas. Da sala
das talhas segue para a direita uma galeria de outras salas mais
pequenas, mas igualmente ricas, ostentando no pavimento lindos
mosaicos de madeira, e nas paredes imaginosos relevos dourados, ou
prateados, e grandes espelhos, tendo na metade inferior graciosas
paisagens e figuras primorosamente pintadas no vidro. A última sala
desta galeria ocupa o elegante pavilhão, que é um lugar
histórico, por ser a câmara onde nasceu e veio a falecer em 1834
D. Pedro IV. Quase tudo ali se conserva no estado em que o deixou o
magnânimo príncipe ao entregar o espírito ao Criador. A cama, com
a modesta roupa que a cobre, não condiz com a riqueza do aposento,
mas revela os hábitos singelos e a lhaneza de maneiras do soberano
que fez consistir a sua maior glória do título de primeiro soldado
da liberdade. Vêem-se nesta câmara três painéis a óleo com os
retratos do principie D. António, filho primogénito de el-rei D.
João VI, falecido de tenra idade, do infante de Espanha
D. Carlos, e de sua primeira mulher, a infanta de Portugal D. Maria
Francisca, filha do mesmo monarca. Exteriormente é este edifício
todo de mármore, profusamente decorado de colunas e pilastras
dóricas e jónicas, de balaustradas, estatuas, vasos, e outros
ornamentos. No tímpano, sobre a grande janela do centro, da
referida câmara, está um baixo-relevo esculpido com muita
perfeição, e que representa uma festa de Baco. A capela principal
do palácio fica ao lado oposto dos jardins, com porta para a rua.
É espaçosa e bem ornada. O oratório particular encerra algumas
obras de arte de muito valor, entre as quais sobressaem vários
painéis de excelente pintura, e uma formosa coluna de ágata, cujo
fuste tem um metro e trinta e três centímetros de altura, e
sustenta uma esta tua de S. Pedro, de prata, cinzelada com muito
primor. Foi dada de presente pelo papa Pio VII a el-rei D. João VI.
São estas, em muito resumido quadro, as coisas mais notáveis deste
vastíssimo palácio. A quinta corresponde-lhe, se o não excede, em
magnificência. São muitos, e muito grandes e variados os jardins.
Os principais estendem-se diante das diversas fachadas do palácio.
De todas as salas mais nobres se abrem portas de vidraças que
comunicam com estes jardins, que são adornados de numerosas
estatuas e vasos de mármore, e de lagos de todos os tamanhos e
feitios, com repuxos de muita diversidade de invenções, alguns
deles guarnecidos de belos grupos de figuras. À saída destes
jardins erguem-se dois altos pedestais servindo de base a duas
estátuas equestres alegóricas da Fama. São de mármore, e foram
esculpidas por Manuel Alves e Silvestre de Faria Lobo, segundo o
desenho do mencionado arquitecto francês Robillon. Ao parque
segue-se a tapada separada por uma cerca dos muros; Tem
basto arvoredo, muitas e espaçosas ruas, e abundância de caça
miúda.»
A ribeira do Jamor atravessa a quinta, encanada e guarnecida de
preciosos azulejos, produção da fábrica do Rato, segundo desenhos
de Robillon, que foram executados por artistas holandeses que para
ali contratou, o marquês de Pombal, sendo há poucos anos
completados por Pereira Júnior, e outro artista. Nos jardins que
circundam o palácio, há lindas plantas, distinguindo-se, entre
elas, o belo geranios do Cabo e soberbas magnólias. Os maravilhosos jogos de água estão
hoje muito mal tratados, e mais de 40 anos de abandono contribuíram
para arruinar, em parte, esta esplêndida propriedade, que se vê na
maior decadência, e cujos azulejos estiveram assim entregues ao
vandalismo. Formam as partes laterais da ribeira do Jamor, ao
atravessar a quinta de Queluz, duas paredes com um prolongamento de
115 m., divididas ao centro por um alegrete sobre dois arcos, e onde
existia a antiga casa da música. Estas paredes são revestidas
interiormente de azulejos, em azul, representando diversos assuntos,
na maior parte, portos de mar, fortalezas salvando, abordagem de
galeões e bergantins conduzindo a terra cortesãs, oficialidade,
etc. A parte superior termina em 20 peanhas de cada lado,
ornamentadas com azulejos coloridos. A parte posterior do lado
esquerdo é também de azulejos coloridos e representa na maior
parte assuntos de caça. Corre, em todo o seu prolongamento uma rua
orlada de amoreiras, que, diz a tradição, foram mandadas plantar
pelo marquês de Pombal, quando desenvolveu a indústria das sedas
no país.
Na estação calmosa as águas do Jamor são represadas
por meio de umas comportas de madeira, formando então a ribeira um
enorme lago com 115 m. de comprido por 12 de largo, onde a projecção
dos azulejos e do arvoredo oferece um quadro maravilhoso. O lago, na
sua maior enchente, forma uma queda de água de 5 m. de altura. O
pintor Carlos Alberto Nunes reproduziu a óleo aquele quadro, e
ofereceu-o ao rei D. Carlos, em 1901. Em 1898 esteve ali o popular
José Augusto, já hoje falecido, arrancando dum lado, colocando
noutro, cheio de boa vontade, diversos azulejos, mas, ignorando o
desenho ornamental, nada adiantou, ficando tudo como anteriormente.
Foi el-rei D. Carlos quem depois ordenou a restauração
e reconstrução dos azulejos neste rio. Encarregou-se do trabalho,
primeiramente, o pintor Pereira Júnior e depois Carlos
Alberto Nunes, seu discípulo. Foi este senhor, com o auxilio e boa
vontade do almoxarife do paço de Queluz Manuel Cardoso dos Santos
Vasques, e do seu ajudante Eugénio Tavares de Almeida e Sousa,
que concluiu esta obra com muito êxito. Ao centro da ribeira
foi levantado um monumento em azulejo policromo, com diferentes
quadros de Mitologia, e tendo num dos panneaux do centro as
armas de Bragança e Orleans, e dos lados as seguintes inscrições:
A
RESTAURAÇÃO E RECONSTRUCÇÃO DOS AZULEJOS
N’ESTE RIO
FOI ORDENADA NO ANNO DE 1900, SENDO ADMI-
NISTRADOR DA FAZENDA DA CASA REAL O
CONSELHEIRO
PEDRO VICTOR DA COSTA
SEQUEIRA
O PINTOR – JOSÉ MARIA PEREIRA CÃO
POR ORDEM DE SUA MAGESTADE EL-REI
D. CARLOS I
E
SUA MAGESTADE A RAINHA D. MARIA AMELIA
D'ORLEANS
SE COMEÇOU A RESTAURAÇÃO DOS AZULEJOS
N'ESTE RIO NO ANNO DE 1900
O ALMOXARIFE DE QUELUZ
MANOELCARDOSO DOS SANTOS VASQUES.
Este trabalho é de Pereira Cão (pseudónimo artístico de
José Maria Pereira Júnior). O monumento é encimado por um grupo
dos que ornamentavam as varandas do palácio, e representa o rapto
das Sabinas, e tendo dos lados mais dois grupos onde se vê Diana e
Adónis. Nas peanhas laterais foram colocados vasos imitando os
antigos que estão no jardim, e, são da extinta fábrica do Rato. A
parte posterior da ribeira, do centro para baixo, e o edifício
hexagonal, donde é tirada a agua do rio para as regas, são em
azulejo, trabalho completamente novo, sendo Os quadros de figuras em
azul e as molduras a cores, estilo Luís XV, e desenhos de execução
de Carlos Nunes. Todo o trabalho moderno está primorosamente te
assente pelo ladrilhador Vicente Rodrigues Reboleira. Queluz tem
estação na linha do caminho-de-ferro de Sintra, entre as da
Amadora e o apeadeiro de Barcarena. A mesma estação serve para
Belas, por isso tem a designação de Queluz-Belas.
É em
Queluz a sede do grupo de artilharia a cavalo. O edifício do palácio
e a quinta deixaram de ser do domínio da coroa, ainda antes da
queda da monarquia e da aclamação da Republica, ficando
pertencendo à nação, assim como as outras residências reais. Na
cerca do palácio foi criada, em Abril de 1911, uma escola pratica
de pomicultura, horticultura e jardinagem.