A Batalha de Toro

 

A Batalha de Toro travada em 2 de março de 1476 entre D. Afonso V e as forças dos reis Católicos, dirigidas por Fernando de Aragão, casado com Isabel de Castela, durante a guerra de sucessão de Castela, é um momento determinante da história de Portugal.

Como escreveu Gomes Eanes de Zurara na sua Crónica da tomada de Ceuta por el-rei D. João I, "nós de uma parte nos cerca o mar e da outra temos muro no reino de Castela".  Toro representa a derrota da cartada continental da coroa portuguesa. Jogou-se e perdeu-se. Passou a haver o Mar, e o Estado moderno português salvou-se no Mar, ou pelo Mar.

 

 
As armas do rei de Portugal

© Bibliothèque Nationale de France

O Rei de Portugal  no Grande Armorial Equestre da Tosão de Ouro (1435-1440)

Minuta do que se acordou em Conselho acerca da provisão pelo vencimento da batalha de Toro em Viana na era de [14]82 e isto porquanto em Castela se fazia por esta mesma coisa.

 

Porquanto as coisas notáveis e dignas de grande memória especialmente aquelas que são feitas pelos grandes Reis e Príncipes devem ser manifestas a todos pela fama delas ficar em lembrança aos que depois vierem e se dar louvor àqueles que o bem fizeram e disso poderem tomar exemplo os que suas obras quiserem, portanto pareceu razão que a batalha que houveram os mais altos e mais excelentes Príncipes, el rei Dom Afonso o quinto que santa glória haja, e el rei Dom João seu filho o segundo nosso senhor que hora é em sendo Príncipe com o Rei dom Fernando de Castela entre Toro e Zamora se deve pôr aqui em escrito sumariamente tomando a força mais principais da verdade do feito como aconteceu por ser coisa digna de muita lembrança

 

Aos dois dias de Março de mil e quatrocentos e setenta e seis anos estando os mais altos e excelentes Príncipes el rei Dom Afonso o quinto e el rei Dom João o segundo nosso senhor que hora é em sendo Príncipe em arraial sobre Zamora da parte da ponte onde vieram por causa dele Rei Dom Fernando ter cercado a fortaleza da dita cidade de Zamora a qual estava pelo dito rei Dom Afonso e ele tinha cercada, porém cobrou a cidade por traição que foi feita por um cavaleiro castelhano que se chamava Valdez e por assim ter a dita cidade e estar mui afortalezada se não podia bem socorrer à dita fortaleza e portanto os ditos senhores rei e príncipe ordenaram de se assentar sobre a dita cidade daquela parte e da outra puseram guarnições para si. Por míngua de mantimentos como por qualquer outra maneira estreitarem a dita cidade e o dito rei Dom Fernando e sua gente que dentro estavam de maneira que lhe cumprisse de cercarem a dita fortaleza e deixarem a dita cidade e estando assim depois de algumas vezes combaterem a torre da dita ponte a qual trabalhavam filharem o sobredito dia.

 

De noite lhes veio um recado de dentro da cidade em como o dito Rei Dom Fernando partia aquela noite com sua gente e iam a um trato que tinham na cidade de Toro. A qual coisa como fosse dita por pessoa digna de ser criada do senhor rei e príncipe acordaram de atalhar a dita coisa e se alevantaram do arraial e irem à dita cidade de Toro por entenderem que assim cumpria e o puseram assim logo em obra. E partidos do dito arraial depois de terem andadas duas léguas e meia vieram novas como aparecia a gente contrária em batalhas a qual coisa como soubesse o dito rei nosso senhor que então era príncipe que trazia cargo de toda a hoste da gente porque o dito senhor Rei seu pai era já diante da dita cidade de Toro a por cobro em ela e mandar recolher sua artilharia e gente de pé em ela e se visse que el Rei Dom Fernando não ia à dita cidade ele logo naquela noite haveria de ir com a gente de cavalo para dar neles 

 

E vendo o dito Rei Dom João nosso senhor como o lugar onde lhe deram as novas não era desposto pera pelejar por ser estreito fez tirar toda sua gente ao campo onde a fez estar queda em batalhas pelos contrários mais despeiadamente descerem ao campo e fez tudo saber ao dito Rei seu pai o qual logo tomou a depois de todo assim de uma parte como, da outra serem em campo ainda que os contrários tivessem a vantagem por terem as costas na serra e por terem mais gente de cavalo e homens de armas e peões porquanto a sua era já quase toda na cidade de Toro que fora diante com a fardagem pelo qual os contrários tinham de vantagem bem setecentas ou oitocentas lanças afora peonagem empero sem embargo de todo os ditos senhores Rei Dom Afonso que Déus haja e El Rei nosso senhor por duas vezes fizeram volver os rostos de suas batalhas contra os inimigos pera verem se queriam pelejar o que eles nunca quiseram fazer e quando viram isto os ditos senhores como esforçados Príncipes e que desejavam verem vir a coisa a conclusão de determinação de todavia darem os inimigos como de feito deram e puseram em obra sem embargo de os contrários terem a dita vantagem conhecidamente e logo o dito senhor Rei Dom Afonso mandou ao dito Rei Dom João seu filho que então era Príncipe que com a vanguarda que levava desse nos contrários o qual com, muito esforçado coração deu neles e rompeu a primeira e segunda batalha dos contrários que logo foram desbaratados, e assim o dito senhor Rei Dom Afonso mui esforçadamente entrou na batalha do dito Rei Dom Fernando e assim as batalhas de uma parte e da outra umas com as outras e o dito senhor Rei Dom João com a sua batalha depois de ter desbaratadas as outras duas com que encontrou volveu sobre as batalhas do Rei Dom Fernando como quer que pela gente que de sua batalha se soltara no alcance dos desbaratados como lhe ficava não pouca gente que a que estava na batalha dos contrários era muito mais em grande numero que a sua e sem embargo de assim ser deu nela e a desbaratou e seguiu até dar outras batalhas dos contrários, e quando a reconheceu, e viu a multidão dos contrários por recolher alguma da sua gente que andava espalhada no alcança, mandou estar queda a sua batalha porque a gente dos contrários seria três tanta como a sua 

 

Onde esteve quedo algumas horas e tão acerca de uma gente da outra que alguns cavaleiros de uma parte e da outra sabiam das batalhas e se arremessam as lanças e vendo os contrários como se escolhia alguma da gente do Rei nosso senhor da que era espalhada e conhecendo que queriam dar neles por estarem tão acerca uns dos outros que todos se bem conheciam, como quer que já fosse noite arrancaram do campo indo-se [a] caminho de Zamora como desbaratados e o dito senhor Rei Dom João com toda sua gente em pos eles os seguiu e os lançou fora do campo e por a noite ser já mui cerrada e escura e pôs suas gentes umas com as outras se não desconhecerem, não quis mais seguir o encalço e mandou estar sua gente queda, e depois de recolhidos os feridos do campo e os prisioneiros, entre os quais foi preso Dom Henrique conde de Alva de Lista, tio do dito Rei Dom Fernando mandou volver sua gente em duas batalhas uma com a sua tornando-se para a dita cidade de Toro com muita vitória, e ao outro dia mandou soterrar os mortos e seus capitães ao dito campo e fazer autos de vencimento o que se fez tudo mui inteiramente sem contradição alguma em a qual batalha fogão, muitos mortos e presos e feridos de uma parte e outra a qual cousa por ser de tanta vitória e louvor que é rezam que fique em memória pera os que depois vierem, e porque a crónica desta coisa ainda não é por extenso feita pareceu bem e, rezam se escrever aqui a soma da verdade de tudo como passou.

 

Minuta das cartas que foram as cidades sobre este caso:

 

Juízes e vereadores Procurador e homens bons nós El Rei vos enviamos muito saudar como quer que todas cousas que de Nosso Senhor recebemos lhe devemos de dar graças como lembrados de seus benefícios e especialmente os Reis e Príncipes o devem fazer pelas vitórias e vencimentos que de sua mão recebem, o que os Reis destes Reinos sempre mui perfeitamente fizeram e guardaram desde o primeiro santo e glorioso Rei Dom Afonso primeiro até nossos dias segundo que por procissões e solenidades ordenadas que se em cada um ano fazem em alguns lugares destes Reinos a todos é notório e querendo nós acerca disto não menos ser grato, e reconhecer a Nosso Senhor o que em nossos dias e presença nos fez de mercê em batalha que houvemos nos Reinos de Castela, entre Toro e Zamora porem ordenamos e mandamos que daqui em diante em louvor de Nosso Senhor e da Bem-aventurada Virgem Maria sua Mãe, e de São Jorge, e de São Cristóvão que o dito dia trazíamos por nossos padroeiros e nome em cada um ano aos dois dias de Março em que foi a dita batalha e vitória a clerezia e todos os dessa cidade façais solene procissão saindo da Sé, e indo por os lugares públicos com toda solenidade, ofícios e jogos, e cerimónia assim e tão compridamente como costumais de fazer em cada dia de Corpo de Deus tirando somente de não ir a arca onde vai o Sacramento e se nessa cidade houver igreja do Precioso mártir e cavaleiro São Jorge e São Cristóvão a procissão vá a ela onde se diga missa e pregassem em lembrança da dita vitória segundo o teor e forma deste caderno que vos com esta enviamos, e onde não houver casa do dito São Jorge e São Cristóvão vá [a] dita procissão e pregue-se onde se costuma ir e, pregar por o dito dia [do] Corpo de Deus e esta nossa carta vos mandamos que registeis no livro da Câmara dessa cidade para sempre se haver de fazer o que dito é em relembrança da causa porque se a dita solenidade faz ser escrita.

Fonte:

Álvaro Lopes de Chaves, Livro de apontamnetos (1438-1489), Lisboa, Imprensa Nacional - Casa da Moeda ("Biblioteca de autores portugueses", 1984, págs. 7175.

A ver também:

A ler:

Manuela Mendonça, O sonho da União Ibérica : guerra Luso-Castelhana, 1475-1479, Lisboa, QuidNovi, 2007 

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