RELATO DA TRAVESSIA DE ÁFRICA FEITA PELOS POMBEIROS,
de 1802 a 1811 (3.ª parte)

Desde meados do século XVIII que Portugal tentou descobrir a ligação terrestre entre Angola e Moçambique. O objectivo era conseguir encontrar produtos que pudessem interessar os mercados asiáticos - sobretudo o da Índia e da China - que eram, na altura e até finais do séc. XIX, deficitários para todas as potências europeias. A primeira tentativa séria de realizar a travessia foi feita  por Francisco José Lacerda de Almeida, em 1798, mas este oficial de marinha morreu ao chegar ao Cazembe - a Noroeste do Niassa.

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Fonte: Maria Emília Madeira Santos, Viagens de Exploração Terrestre dos Portugueses em África, Lisboa, 1978

A viagem dos Pombeiros, de 1802 a 1811

«DOCUMENTOS RELATIVOS À VIAGEM DE ANGOLA PARA RIOS DE SENA» - 3.ª Parte

 

O Negro

© Museu de Soares dos Reis

O Negro, quadro de João António Correia, de 1869

51.°

 Segunda feira 25 saimos do pé do rio Ancula em que. levantamos ao Cantar de galo, vindo-nos Subindo com o mesmo rio Ancula , pasamos um riacho de pequena Largura, e durante a marcha viemos para outro pouzo dezerto, e ao pé do dito rio Ancula, pela banda de cá, e entramos, no cerco dos Casadores, chegamos ao meio dia sem chuva, e andamos com o Sol a cara, não incontramos com ninguem.

52.°

Terça feira 26 saimos do rio Anonla, levantamos as 6 oras de menhaã pasamos dois rios de pequenas larguras que ignoramos os nomes, e durante a viagem viemos para o Citio de hum preto chamado filho do potentado Pande de nome Muana Auta o qual não fallamos com elle por ter hido para o citio de Pay, e nos mandarão entrar nas cazas dos Povos do mesmo Potentado Pande, chegamos ao meio dia, e ao pé de hum rio chamado RiLomba, e demos de prezente dois xuabos, e cem cauris, e sendo a tarde fui a caça e matei hum viado a tiro, e os Escravos de noso Guia apanharam huma Bufra morta , que tinha matado o Lião. não incontramos com ninguém.

53.°

Quarta feira 27 saimos do citio chamado Muana Auta Levantamos as 2 oras de menhaã, pasamos hum riaxo chamado Quimane, e durante a viagem, viemos para o citio de potentado chamado Pande, o qual não avistamos com elle no dia que chegamos, e somente mandou ospedar o Guia que vinha-mos com hum garrafão de bebida chamada ponbe, e trazendo recado o portador delle dito que estava ocupado com portadores do Rey Cazembe, e que com mais sucego nos avistava com elle, chegamos no dito citio as 2 oras de tarde, fabricamos noso cerco ao pé de um rio chamado Murucuxy pela banda de lá, andamos com o Sol a Cara, não incontramos com ninguem.

54.°

Quinta feira 28 parados cauzado do dito potentado, assim como tambem sesta feira, Sabado, e Domingo, para tratarmos com elle a nossa viagem por ser Maior do Rey Cazembe, que viemos derigidos ao Muropue para o Rei Cazembe, nos despachar com seo Guia que achar Capaz para nos Levar para a vila de Tete a entregarmos huma Carta para o Illustrissimo Senhor Governador da dita vila mandado por EIRey que elles nomeão Musneputo , e demos de prezente vinte chuabos de boa qualidade de fazenda de lãa , e elles nos ofereceo dois quicapos de milho muido e trinta postas de Carne de Bufra seca, e respondeu que podia-mos seguir a nosa viagem, e ir tratar a nosa pertenção.

55.°

Segunda-feira 1.º de Outubro, saímos no sítio do potentado Pande, levantamos as 6 oras de manhã passámos dois riachos de pequenas larguras, e durante a viagem, viemos para o sítio de um preto chamado Cahiumbo Câmara, o qual, não falámos com ele no dia da chegada, e só vieram no nosso pouso, dois pretos que vinham nos ver, e não demos nada de presente, chegámos no mesmo às duas horas da tarde, e não tivemos perseguição de dívidas, entrámos nas casas dos viajantes que vão em Cazembe, andámos com o Sol à Cara, e não encontrámos ninguém.

56.°

Terça-feira 2 de Outubro saímos do sítio do preto Cahiumbo Câmara, levantámos ao Contar do galo, passámos um rio que tinha-mos pernoitado, e durante a viagem viemos para o pouso deserto chamado Quidano, e ao pé de um rio que ignoramos o nome, chegámos no dito ao, meio dia, fabricámos nosso cerco com chuva pela banda de cá, não encontrámos com ninguém, e passando-nos uma várzea grande achámos bastantes azebras [sic] a pastarem na dita várzea, e quando nos viram, fugiram.  

57.º

Quarta-feira 3 saímos do pouso deserto Quidano, e levantámos às 2 horas da manhã, passámos um rio de pequena Largura, e durante a viagem viemos para o sítio antigo de um preto chamado Luncongi já despovoado. Chegámos no mesmo pouso às 4 horas de tarde sem chuva, fabricámos nosso cerco ao pé cio riacho pequeno que ignoramos o nome, andámos com o Sol na Cara, e não [nos] encontrámos com ninguém.

 58.°

Quinta-feira 4 saímos do sítio despovoado do Lunconge, levantámos às 7 horas de manhã, não passámos rio, e durante a viagem viemos para o sítio novo do mesmo potentado Lucongi pela banda de lá de um rio chamado Luvire o qual passámos em Canoa que poderá ter pouco mais ou menos doze Braças da Largura, e vai desembocar no rio Luapula, e entrámos nas casas do mesmo sítio falámos com o dito preto Luncongi a nossa viagem que vamos para Cazembe, e demos de presente hum chuabo, e respondeu que o Rei Cazembe estava com Saúde, e que ele ficava pronto para procurar de Comer para o Guia que nos trouxe e com isto invernámos um dia Sexta feira, e trouxe vinte e quatro postas de Carne fresca para o dito Guia, e para nós outras vinte postas de Carne, e dizendo que no seu sítio se achava faminto de fome.

59.°

Sexta-feira 5 saímos do sítio de Lunconge, e levantámos ás 6 horas de manhã, passámos dois rios que ignoramos os nomes, os quais vão desembocar no rio Luvire, e durante a marcha viemos para o pouso deserto; e ao pé do mesmo rio Luvire vindo-nos descendo com o dito rio chegámos no mesmo pouso às 3 horas de tarde, fabricámos nosso cerco com bastante chuva, andámos com o Sol na Cara não [nos] encontrámos com ninguém.

60.º

Sábado 6 saímos do pouso deserto, e que levantámos ao cantar de galo, sem chuva, não passámos rio e durante a viagem, viemos para o sítio do menor potentado chamado Muene Majamo Amuaxi falámos com ele a nossa viagem, que vamos para o Rei Cazembe, e não demos nada de presente chegámos no dito sítio às duas horas de tarde, fabricámos nossas Barracas ao pé do rio chamado Musumbe pela banda de lá, não [nos] encontrámos com ninguém, e não vimos raridade de qualidade.

61.°

Domingo 7 saímos do sítio do preto Muene Majano, e levantámos as 7 horas de manhã, não passámos rio, e viemos para o sítio de potentado chamado Muaxy, falámos com ele a nossa viagem que somos dirigidos ao Rei Cazembe por ordem do Muropue, e respondeu que o herdeiro do Estado de Cazembe estava com saúde e que ele de sua parte nos hospedava por parte do mesmo Rei Cazembe, e invernámos um dia para nos, dar mantimentos, chegámos no dito sítio ao meio dia e nos mandou entrar nas Casas de seus Escravos, andámos com o Sol à Cara e não encontrámos com ninguém, e demos de presente Sete Chuabos e um Espelho pequeno e ele nos deu cinco quicapos de milho Moído, e sessenta postas de Carne, e nos disse que sigam a sua viagem.

62.º

Segunda-feira 8 saímos do sítio do potentado Muaxy, levantámos às 5 horas da manhã, passámos um riacho de pequena largura que ignoramos o nome, e durante a viagem viemos para o pouso deserto, e ao pé de um rio de pequena largura de pedra por dentro que ignoramos o nome, chegámos no dito deserto às 4 horas de tarde sem chuva, fabricámos nosso Cerco ao pé do mesmo rio pela banda de cá, encontrámos com três pretos que iam comprar Sal no Sítio de Muaxy que acima dito, e terem vindo no Corte do Rei Cazembe, andámos com o Sol à Cara, e não vimos nada de raridade.

63.°

Terça-feira 9 saímos do pouso deserto, em que levantámos às 2 horas de manhã passámos cinco riachos que ignoramos os nomes, e vindo-nos subindo com outeiro chamado Cunde Irugo, e durante a viagem, passámos um rio chamado Cavulancango, e levantámos às 6 horas de manhã digo Cavulancango o qual poderá ter pouco mais ou menos sete braças de Largura que nos deu água na Cintura no passar, e vai desembocar no Rio Luapula, chegamos no dito pouso ao meio dia, fabricamos nosso Cerco ao pé do mesmo Rio pela Banda de Lá , encontrámos com seis pretos Escravos do Cazembe, que iam para o Sítio do Muaxy, não tratámos nada com eles, andámos com o Sol da mesma forma.

64.º

Quarta-feira 10 saímos ao pé do rio Cavulancango, levantámos às 6 horas de manhã, não passámos rio, subindo com o mesmo outeiro Conde Irugo, e durante a marcha viemos para outro pouso deserto, e ao pé de um rio de pequena Largura chamado filho de Cavulacango, em cima  do mesmo outeiro, chegámos no dito pouso, às 2 horas de tarde sem, chuva, e entrámos no Cerco dos viajantes pela banda de Lá de mesmo rio, andámos com o Sol da mesma forma.

65.º

Quinta-feira 11 saímos do pouso deserto, e em cima do outeiro levantámos às 2 horas de manhã, passámos dois riachos correntes, e durante a Marcha viemos para outro deserto em cima do mesmo outeiro, chegámos às 6 horas de tarde com chuva, fabricámos nosso Cerco, não encontrámos com ninguém.

66.°

Sexta-feira 12 saímos em cima do outeiro, levantámos às 7 horas de manhã, passámos 7 riachos de pequenas Larguras e desembocam no rio Luapula, e viemos para outro deserto, e ao pé de um rio de pequena Largura, onde achámos Cerco feito não encontrámos com ninguém andámos com o Sol à Cara.

67.°

Sábado 13, saímos do pouso deserto, levantámos às 2 horas de manhã, passámos dois riachos, e a bom andar passámos um rio chamado Lutipuca de cinco braças de Largura, e vai desembocar no Luapula, e durante a viagem viemos para um sítio do maior de Cazembe chamado Souta, e o qual não achámos no sítio por ter ido levar tributo ao Cazembe chegámos às 2 horas de tarde sem chuva, não encontrámos com ninguém, e não tratámos nada de dádivas.

68.°

Domingo 14 saímos do sítio do Souta levantámos à madrugada passámos segunda vez o Rio Lutipuca a pé, e durante a viagem, viemos para o pouso deserto, e ao pé de um riacho que ignoramos o nome chegámos ao meio dia, no dito pouso, e já andámos com o Sol ao Lado direito, não encontrámos com ninguém.

69.°

Segunda-feira 15 saímos do pouso deserto, no qual levantámos às 5 horas de manhã, não passámos rio, e durante a viagem, viemos para outro deserto e ao pé do Rio Lutipuca o qual viemos descendo com ele dito rio chegámos no mesmo ao meio dia sem chuva, andámos com o Sol ao Lado direito, não encontrámos com ninguém, e não vimos raridade.

70.°

Terça-feira 16 saímos do pouso deserto levantámos às 6 horas de manhã não passámos rio, e durante a viagem viemos para o Sítio de um potentado menor de Cazembe chamado Munxaqueta, falámos com ele a nossa viagem que vamos ter com o Rei Cazembe, e nos mandou agasalhar e nas Casas dos seus povos, e chegámos no mesmo Sítio às 2 horas da tarde, demos de presente quatro xuabos de Serafina, e nos respondeu que estimou o seu presente, e nos ensinou o Caminho, e não tratámos mais nada.

71.º

Quarta-feira 17 saímos do sitio do Munxaqueta, e levantámos ao Cantar de galo, vindo-nos passando uma grandiosa varja com pequena água, a qual poderá ter pouco mais ou menos dez léguas de comprimento, e cheia animais, azebres, bufras, veados, corsas e mais outros animais que não sabemos os nomes e viemos, para o sítio de outro potentado chamado Muaxies, e com seu Irmão também chamado Quiocola falámos com eles a nossa viagem que vamos dirigidos ao Rei Cazembe, chegámos no mesmo sítio às 4 horas de tarde, e demos de presente aos dois potentados doze chuabos, e responderam que o Rei Cazembe se achava com Saúde; não encontrámos com ninguém, e andámos com o Sol da mesma forma.

72.º

Quinta-feira 18 saímos do sítio do Munxaqueta: levantámos às cinco horas de manhã, sem chuva, vindo-nos, cortámos dita varja ao poente dela passámos em Canoa o rio Luapula, e demos aos pilotos dois chuabos de fazenda de lãs, e viemos para o sítio de um preto chamado Tambo Aquilata, falámos com ele a nossa viagem que viemos do Muropue ter com Rei Cazembe, e tratarmos noras dependências, chegamos no dito sítio às 4 horas de tarde, e fabricámos ao pé do mesmo sítio, o mesmo rio Luapula poderá ter pouco mais ou menos cinquenta e sete braças de largura, o qual não sabemos onde vai desembocar. Não encontrámos com ninguém.

73.°

Sexta-feira 19 saímos do sítio do Tambo Aquilata, levantámos às 6 horas de manhã não passámos rio, e vindo nós descendo com o mesmo rio Luapula, e viemos para o sítio da Irmã do mesmo Cazembe chamada Pomba ao pé do mesmo rio,  e logo nas mandou agasalhar nas Casas dos seus povos, e no mesmo dia da chegada não falámos com ela, chegámos no mesmo sítio às 2 horas de tarde não encontrámos com ninguém.

74.º

Sábado 20 Parada no dito sítio da Irmã do Cazembe por ordem dela mesma, e sendo as duas horas de manhã nos mandou chamar e fomos dentro dos seus muros, e nos perguntou de donde vínhamos respondemos que viemos de Angola, e chegámos na Corte de Muropue, o qual nos entregou este nosso Guia, e virmos ter com o Rei Cazembe vosso Irmão para nos conceder Licença irmos a Vila de Tete, a qual respondeu que estava muito bonito o seu Muropue mandar brancos ter com seu Irmão, o, que nunca fizeram os antepassados Muropues, e que era grande fortuna do Herdeiro do Estado de Cazembe seu Irmão, e nos ofereceu uma Cabra grande e quarenta peixes frescos, e duas garrafas de bebida chamada pombe, e seis quicapos de farinha de mandioca seca, e demos de presente trinta e dois xuabos, um Copo azul, um Mozenze de cem pedras brancas, respondeu que ficava obrigada da sua dádiva, e invernámos para a dita mandar dar parte ao Rei Cazembe da nossa chegada como se obrigação dela aparecer todo o viajante mandar participar ao Irmão, e com isto estivemos à espera seis dias no sítio dela, e vieram os portadores em busca de nós.

75.°

Sábado 27 saímos do sítio da Irmã do Cazembe levantámos às 7 horas de manhã sem chuva , vindo nós descendo com o rio Luapula, passámos um rio de duas braças de largura , que ignoramos o nome, e vai desembocar no mesmo Luapula, e durante a viagem viemos para o sítio de um preto chamado Murumbo, chegámos no dito sítio ao meio dia, não encontrámos com ninguém andámos com o Sol ao Lado direito, e entrámos nas Casas dos do sítio e não vimos nada de raridade.

76.°

Domingo 28 saímos do sítio do Murumbo, levantámos às 2 horas de manhã, e vindo nós descendo com o rio que assim dito ao Lado Esquerdo, passámos dois rios Lufubo, e Capueje que vão desembocar no mesmo rio, e durante a viagem viemos para o sítio de um preto chamado Gando e ao pé de um rio chamado Gona, no qual sítio tratámos nada de dádivas, chegámos às 6 horas de tarde, andámos com o Sol da mesma forma.

77.°

Segunda-feira 29 saímos do sítio do Gando, e ao pé do rio Gona levantámos às 5 horas de manhã passámos dois rios Belenje, e outro ignoramos o nome, e durante a viagem viemos para o sítio de um preto chamado Canpungue, e chegámos no dito sítio às 3 horas de tarde, encontrámos com bastante gente do Rei Cazembe carregados de Lenha, e demos de presente ao dito preto Canpungue um chuabo de Zuarte, e nos disse que sigam a viagem que o Cazembe estava à espera de nós.

78,°

Terça-feira 30 saímos do sítio do preto Canpungue, levantámos às 7 horas de manhã sem chuva, não passámos rio, e durante a viagem viemos para o sítio de um preto chamado Luiagamra do Cazembe, chegámos no mesmo sítio às 4 horas de tarde, entrámos nas Casas dos mesmos; e ao pé de um rio chamado Canengua de pequena largura que vai desembocar no rio chamado Mouva que se acha situado o mesmo Rei Cazembe, e não demos nada de presente ao dono do sítio, e daí mesmo fizemos parada a mandar-nos dar parte por nossa chegada um dia e fazendo-nos um pouco de tempo veio o portador do mesmo Rei Cazembe; e trazendo-nos de hospedagem, quatro Murondos de bebida chamada poube, e cem postas de carne fresca juntamente com farinha de mandioca para nossa alimentação, e além disso com recado que o Rei Cazembe nos mandava por ora parar, no mesmo sítio, e que ele mesmo nos mandava recolher com mais vagar: Amanhecendo-nos logo sendo às duas horas de manhã nos mandou chamar por seu maior e com ordem para que em chegando ao pé dos muros dos seus maiores, atirássemos tiros que pudesse tirar que é para sinal de nós Viajantes chegarmos na sua Corte, e nos mandou agasalhar em Casa do seu Porteiro das suas portas chamado Fumo Aquibery, e nesse dia não tratámos nada sobre a nossa viagem que se não ele dito Rei Cazembe nos mandar mantimentos de farinha, peixe, carne fresca, e pombos, cabras, e comeres já feitos para nossa gente, e com grande alegria nos ver e sendo manhã nos mandou chamar que viéssemos dizer o que nos traz; e o achámos assentado na sua rua Pública onde Costuma dar suas Sentenças a seus Povos, e com todos os seus Potentados Maiores dos seus Conselhos, ele todo vestido de seus panos de seda , veludo, missanga de várias qualidades nos Braços, e pés rodeado do seu Povo e com todos seus instrumentos de grandeza de Barbaridade, e mandou dizer, que falasse o Guia que com ele viemos do seu Muropue: Falou o Guia que aí lhe, trago brancos de El-Rei que eles chamam Muenuputo, vir comunicar com vós Rei Cazembe, e os tratar bem sem malícia, executando os desejos que eles vêm encarregados, conceder-vos Rei Cazembe Licença juntamente com seu Protector que vos achar capaz para os Levar na Vila de Tete a entregar uma Carta ao Ilustríssimo Senhor Governador da dita vila, recomendados com esta ordem de donde vieram que é Angola, e nisto também manda recomendar bastantemente o seu Muropue fazer todo o necessário para despachar ditos viajantes onde desejam e os tornar a mandar-lhes para o dito Muropue os mandar entregar de donde vieram. Respondeu o Rei Cazembe que estimava muito e não pouco o seu Muropue mandar-lhe viajantes que vieram Longe, e que a muito tempo ele também anda com intentos de abrir o caminho de Sena , assim como ficar tão alegre de ver viajantes de Muropue, o que nunca fizeram os anteparados Muropues, e que há de executar tudo que for no possível e não só dar guia que se não ele mesmo pessoalmente levantar para o arraial de Guerra, a ir combatendo os Salteadores Ladrões que no Caminho se acham que impedem o Caminho para os viajantes que querem vir comunicar com ele Rei Cazembe, tinha-mos partido com o mesmo Rei Cazembe até em um sítio dos seus Povos que ficava coisa de meia Légua do referido Rei com bastante Guerra para nos vir fazer passar no dito Caminho, e depois houve perturbação dos seus Povos não quererem guerrear, e ficou a deligência frustrada, e voltámos com ele para o sítio contra a sua vontade, e entrou a mandar botar fora os Potentados, e outros a cortarem as orelhas, e outros foram pagando Cabeças, e manilhas e no segundo mês nos entregou o seu mais Potentado chamado Muenepanda para nos vir trazer com mais Povos, e chegando-nos num Pouso deserto chamado Quipire voltou para trás, e dizendo que na Vila de Tete era muito Longe, e a guerra que ele dito Muenepanda levava para combater os Potentados que no Caminho se achavam eram poucos e que não quer se meter em risco, e voltámos com ele, e fazendo-nos meio Mês nos apareceu o Preto de Gonçalo Caetano Pereira de nome Nharugue, partimos com ele até que chegámos nesta vila de Tete. Dito Rei Cazembe é um Preto muito tinto e rapagão barba razarena olhos vermelhos muito conversário com brancos negociadores que na sua Corte vem a Negociar, coisa de semente farinha de mandioca milho curro , milho moído, feijão , canas bastante, peixe que pescam seus Povos no Rio que ao pé dele está chamado Muova as pontas de marfim; vem na outra banda do Rio Luapula que vem tributar seus Povos, e as pedras verdes vem na terra chamada catanga, negociadores vem á nação Muizas, a comprar marfim a troco de fazenda, e outra nação chamada Tungalagazas que trazem cativos, e manilhas de Latão, cauris , e azeite de palma, e alguma fazenda que dito Rei Cazembe tem, vem no Cola terra de Muropue, e missanga grossa vistosa no dito território bastante Sal, que tiram na mesma terra , e tem também outra qualidade de Sal de pedras que vem em tributos na Salina que está no Caminho da terra do Mulopue chamada, Luigila, onde se acha um seu potentado, e Parente chamado Quibery a tomar sentido da dita Sa!ina, assim como mandar tributos ao seu Muropue do mesmo sal, e fazendo que ele compra com os viajantes que do Muropue vem. Não assentei os dias de Inverno que passámos no Caminho precedido de moléstias, e não vi mais nada na Gorte do Rei Cazembe, que me esquecesse a escrever que senão o que está declarado.

 

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Fonte:

«Explorações dos Portugueses no Interior da África Meridional», Anais Marítimos e Coloniais, n.º 5, 3.ª série, Parte não-oficial, Lisboa, Imprensa Nacional, 1843, págs. 163-190.

A ler:
  • R. J. Hammond, Portugal and Africa 1815-1910: A Study in Uneconomic Imperialism. Stanford, Stanford University Press, 1966;
  • Maria Emília Madeira Santos, Viagens de exploração Terrestre dos Portugueses em África, Lisboa, Centro de Estudos de Cartografia Antiga, 1978;
  • Gervase Clarence-Smith, The Third Portuguese Impire, 1825-1975. A Study in Economic Imperialism. Manchester: Manchester University Press, 1985;
  • Valentim Alexandre e Jill Dias, O império Africano,1825-1930, vols. 10 e 11 da Nova História da Expansão Portuguesa, dir. por Joel Serrão e A. H. de Oliveira Marques, Lisboa, Editorial Estampa,  1998-2001.

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